sábado, 13 de junho de 2009

Pensatas de todos os dias

Um dos melhores anúncios que conheci, foi, sem dúvida nenhuma “Abaixo o Dia das Mães”, criação de Neil Ferreira, Carlos Wagner de Moraes e Jarbas José de Souza (1) publicado em 1969, que foi muito comentado à época. A referida – e brilhante – peça partia do princípio elementar de que mãe não tem dia, porque todo dia é o dia das mães, tese defendida em seu texto.
Sempre achei que as grandes idéias são simples. Simples no seu conceito, simples porque estão ali, nos olhos da gente, bem no nariz da gente. O anúncio foi assunto não somente no meio publicitário, como pela população em geral. Por quê? Bom, imaginem só um dia de “babação de ovo” com anúncios – na maioria piegas – tecendo elogios à “mamãe lindinha” ou “mãe querida”, etc, etc, dar de cara com um título em letras garrafais e um excelente leiaute com um tema tão polêmico? Chocante!
E me refiro a este título magistral, justamente porque nos tempos pelos quais passamos, os “Dia Disso”, “Dia Daquilo” se transformaram pura e simplesmente no “Dia do Cifrão”. Os capitalistas, os Ebenezer Scrooge (2) da vida criaram uma parafernália circense de dias comemorativos em que reinam apenas os fantasmas do lucro ganancioso; a quase obrigação de alguém consumir qualquer coisa para presentear outro alguém, numa orgia surubática de consumo desenfreado.
Lembremo-nos que um beijo sincero e afetuoso ou um singelo cartão amoroso, o despendio de algum tempo criando alguma forma de homenagear alguém são muito mais valiosos do que o simples fato de entrar numa loja e adquirir seja lá o que for, pela simples razão de exibir o quanto se gastou em um presente qualquer. Como diz uma campanha publicitária que circula por aí: “... existem coisas que não teem preço”.
Abaixo o Dia do Cifrão!

(1) Publicitários que revolucionaram a comunicação no país a partir de seu trabalho na Norton, abrindo novos caminhos e campanhas memoráveis como a do “Conhaque do Papa” e outras inesquecíveis...
(2) O rico e avarento personagem da conhecida obra de Charles Dickens: “Um conto de natal” (A Christmas Carol).

Nota ao pé da página: não me considero um moralista. Esta crítica é tão somente um posicionamento quanto ao sistema em sua sede ambiciosa por lucros, que transformam o indivíduo em um ser irracional que comete seus atos consumistas sem pensar, sem refletir, movido apenas pela lavagem cerebral e a força massificante da mídia na vulgarização dos costumes.

13 comentários:

maria disse...

Os shoppings ficam cheios. Nas vésperas do dia 12 eu e meu namorado fomos comprar os respectivos presentes e foi um tumulto da peste.
Agora tem uma coisa. Todo mundo pergunta o que qui seu namorado deu pra você. A idéia de fazer um cartãozinho é boa, mas você acha que não vão dar falta de um presentinho?
No máximo pra acompanhar o dito cujo.

Jonga Olivieri disse...

Talvez eu seja o único publicitário do mundo (exagero?) que detesto shoppings.
Atualmente vou porque tornou-se uma forma prática. Tem várias livrarias, várias lojas de DVD, dá pra tomar um chope ou um cafezinho. Mas, sinceramente eu me sinto num filme de ficção científica daqueles em que as pessoas ficam rodando em ambientes do tipo. Éca!
Quando chove então, é uma solução.
Bom, temos que nos entregar aos sinal dos tempos e dar um update nos costumes. Sou comodista.
Mas juro que quando vou aum deles, já sei as lojas que quero ir e não suporto ficar fazendo footing. Talvez por ser fiel à minha mulher e não precisar ficar circulando atrás de "minas" dando sopa. Já os jovens (como você) nasceram nessa era e teem como aproveitar.
Mas, acredite, há anos eu e a Vi detestamso ficar dando presentinhos. Não que não o façamos... Nos aniversários de namoro, nos natalícios.
Mas, mesmo assim sempre crio um cartãozinho, imprimo no computador. Acho que isso tem um valor que vem de dentro da gente. Um valor muito maior do que o simpes "vil metal" pode ooferecer.
Uma questão de ordem de grandeza nos valores que estabelecemos.
Nosso filho sempre teve o hábito de pendurar uma mensagem no espelho do nosso banheiro nessas datas (as reais e não as fictícias), o que nos deixa muito emocionados.

Ieda Schimidt disse...

Mais uma vez tu tem toda razão nas crícas ao capitalismo selvagem. Mas, afinal, existe capitalismo civilizado? Rssss!
Gostei muito da frase "orgia surubática de consumo desenfreado".
Aliás aqui em casa também odiamos estes dias disso ou dia daquilo.
Nota 10 para o teu post!

André Setaro disse...

Concordo plenamente com os "dias" disso e daquilo. Houve acentuada aceleração do consumiso a partir dos anos 80, principalmente com o advento da tal globalização e do perverso neoliberalismo. Até meados dos anos 70, por exemplo, não existiam shoppings centers em Salvador. Atualmente, sem contar os menores, existem cinco grandes, que ficam superlotados de idiotas a circular por eles porque convocados pela massa publicitária. Há coisa mais irritante do que os infernais anúncios dos planos de celulares? O caso dos dia das mães leva, inclusive, a uma competição dentro da própria família para ver quem dar o melhor presente "à sua querida mamãe". Há verdadeiras disputas e a competição reflete bem o caráter selvagem do capitalismo. E hoje é dia de quê? Ontem, sei, foi o de Santo Antonio, o santo casamenteiro.

Jonga Olivieri disse...

E é mesmo uma orgia, uma suruba no dizer popular.
Quanto ao capitalismo, ele é selvagem em sua essência. Acho uma redundância acrescentar o "selvagem".
Mas pode ser uma força de expressão.
E obrigado pela nota 10...

Jonga Olivieri disse...

Shopping Centers no Brasil, que eu me lembre, o primeiro foi o Iguatemi de São Paulo, na avenida Faria Lima em Pinheiros.
No Rio, o BarraShopping foi inaugurado em meados dos 70. O BH Shopping, que é da mesma rede foi um pouco anterior.
Daí veio a tsunami de shoppings que cerrou as portas de muitas lojas nas ruas e desbancou as famosas galerias de Ipanema e Copacabana.
Mas, relamente me lembram filmes de SF em que aquele povo fica rodando em lugares fechados... Iguais a eles.
Lembro que o Dia das Mães era dos meus tempos de criança. Aliás, o da Criança também. Mas depois veio a leva avassaladora dos Dias dos Cifrões que existem muitos e cada vez mais.
Nos tempos antigos você dava uma lembrancinha, um cartão, flores e ponto final. Hoje, a coisa virou paranóia. Também, uma sociedade paranóica e doente como a nossa tem que acarretar com este tipo de coisa.

Anônimo disse...

Devemos ter em conta que o anúncio citado é uma peça tão grandiosa para a publicidade quanto foi o "Think Small" da DDB para a Volkswagen, quando o Bug foi lançado nos EEUU.
É que passados exatos 40 anos, não se tem idéia do quanto certos tabus e caretices haviam na época.
O referido "Abaixo o Dia das Mães" foi um choque. São Paulo inteira comentava pelas esquinas e nos cafés o quanto ele era ousado. Uns defendendo e outros atacando.

(a) Um publicitário amigo (e seu leitor + ou - assíduo)

André Setaro disse...

Errata:
consumismo
quem dá o melhor presente

Mas falando em galerias, lembro-me de ter lido que Glauber Rocha gostava muito de passar a tarde na Galeria Menescal em Copacabana. Há um plano, incluside, de Jardel Filho, em 'Terra em transe', a sair dessa galeria e a luz estoura.
Conheço pessoas maníacas por shoppings. Um conhecido meu vai ao Iguatemi todos os dias. Entre 10 da manhã e sai 10 da noite. É um 'iguatemílico'. Idéia fixa.

Jonga Olivieri disse...

Foi mesmo um anúncio muito polêmico porque a sociedade de então era mais reprimida quanto a certos valores "morais".

Jonga Olivieri disse...

Isso é mesmo uma doença: a "iguatemite aguda".
A Galeria Menescal existe até hoje. Faço terapia alí perto e vez por outra passo por uma lanchonete árabe (fica bem no meio dela) só para saborear uma esfiha muito boa que existe no local.

Jonga Olivieri disse...

Obs: meu comentário sobre a "esfiha" me lembrou Guió...
É, caro André, quem sai aos seus não degenera.
Mas, para além disso a Galeria Menescal, apesar de seu ar meio decadente ainda é um local charmoso.

Jonga Olivieri disse...

Eliana mandou um comentário, mas o perdi. Por sorte havia copiado e reproduzo a seguir:

"E ha ainda um grande problema: o que fazer com os objetos? A partir de um certo momento, você tem de omeçar a dar suas coisas pra poder comrar ou mesmo receber outras. Quem usa realmente todas as roupas que tem? E por outro lado, nao se pode usa-las indefinidamente porque o fenomeno moda existe realmente. Por aqui ha um momento do ano em que as associaçoes de caridade nao recebem mais doaçoes de roupas pois estao com todos os espaços ocupados... A abundância ladeia a precariedade."

Jonga Olivieri disse...

Eleiana. Você resumiu tudo quando disee: "A abundância ladeia a precariedade".
A sociedade é composta desses excessos. Para mais ou para menos.
O socialimso sempre foi uma meta do ser humano (pelo menos alguns mais humanos) por esta razão específica. Ou seja: "uns com tanto, outros com aão pouco"... Como se diz no popular.