Neste domingo a Pensata é de Jorge Vital de Brito Moreira e um excelente texto
sobre futebol e política.
“Eu
não troco a minha camisa com assassinos”
“Je n’échange pas mon maillot avec des assassins”
De acordo com o jornal francês “SPORT”,
esta é a frase
que utilizou Cristiano Ronaldo, a estrela da seleção portuguesa, no final do
jogo de futebol entre as seleções de Israel e Portugal, realizado no dia 19 de
abril de 2013 (última sexta feira). O jogo entre as duas seleções fazia parte
da fase eliminatória para participar da Copa do Mundo que será realizada no
Brasil em 2014.
Ao terminar o encontro, um jogador israelense tirou a
camisa e pediu a Ronaldo que trocasse pela sua. Ronaldo recusou o pedido,
explicando que não podia vestir uma camisa com a bandeira do Estado de Israel.
No vestuário, quando os jornalistas perguntaram a
Cristiano Ronaldo porque havia recusado a troca de camisa com o jogador de
Israel, Cristiano disse exatamente: “Eu não troco a minha camisa com
assassinos” ("Je n’échange pas mon maillot avec des assassins" Cristiano
Ronaldo après le match Portugal Israel).
Esta
importante notícia do mundo futebolístico, envolvendo a segunda maior estrela
do futebol mundial, foi divulgado por diversos jornais espanhóis e latinoamericanos
tais como La Republica, Cuba Debate, Kaos en la Red
(e outros); também no YouTube.com (http://www.youtube.com/watch?v=o4KRqu2UtAQ), mas
não achei nada nos jornais brasileiros.
Não sou fã de Cristiano Ronaldo, mas
me parece muito estranho (ainda que eu tenha buscado a notícia nos grandes e
pequenos jornais brasileiros), não ter encontrado essa notícia em lugar nenhum,
afora uns poucos blogs. A inexistência surpreendente (ou não) desta notícia
no país do futebol dá o que pensar.
Não sou torcedor do Real Madrid
(um clube de origens franquistas fascistas), nem admiro o estilo de jogar da
seleção portuguesa, mas a pergunta continuou na minha cabeça. – Porque a
ausência desta notícia na imprensa escrita e televisiva do país do futebol?
Em alguns blogues na língua
espanhola, pude ler comentários dos leitores e suas reações pró ou contra a
atitude de Cristiano Ronaldo e decidi partir dessas reações para tentar analisar
e compreender a razão para a ausência dessa notícia nos jornais do Brasil.
Entre as reações que condenavam a
atitude e a fala do jogador, selecionei algumas para comentar, e se possível,
responder. Classifiquei as reações em 3 grupos.
As reações do primeiro grupo
poderiam ser caracterizadas sinteticamente pela pergunta: - Que culpa tem o
jogador da seleção de Israel que seu país esteja assassinando palestinos?
O segundo grupo poderia ser caracterizado pela frase
muito comum entre os torcedores: - Não se deve misturar futebol com política,
nem com religião, porque são coisas completamente separadas.
O terceiro grupo poderia ser caraterizado pela reação
mal humorada: - O que disse Cristiano Ronaldo não me interessa. O que me
interessa é saber quem é o melhor jogador de futebol do mundo: Cristiano Ronaldo,
Messi, Maradona ou Pelé?
Tratarei de responder aos três grupos, começando pelo
primeiro: Não se trata, caro leitor, da culpa de um jogador israelense sobre os
crimes do Estado de Israel, pois quase toda a maioria silenciosa (de Israel e
dos EUA), é cumplice e responsável (direta ou indiretamente) pela produção e
reprodução desse abominável estado fascista de coisas no Oriente Médio.
Trata, melhor, do seguinte: Cristiano Ronaldo (uma
estrela do futebol internacional, sobre a qual os meios de comunicações
internacionais não param de fotografar e reportar diariamente), na minha
opinião, teve uma atitude completamente apropriada às circunstâncias: se ele tivesse
dado sua camisa a um jogador da seleção que representa a nação e o Estado de
Israel, estaria fazendo propaganda para um estado terrorista. E, desta forma,
estaria sendo cúmplice (indireto) dos crimes de guerra que o Estado de Israel vem
cometendo contra o povo palestino.
Tratarei de dar uma resposta ao segundo grupo: Não se
deve misturar futebol (ou esporte) com política, caro leitor, porque já não é
necessário. Elas já estão misturadas desde sempre. Para confirmar o que acabo
de dizer vou mostrar alguns exemplos que registram estreita relação entre
esporte, futebol, poder e política no século XX, perguntando aos leitores:
Quem poderá negar a relação explicita entre Hitler, o
nazismo e os “Jogos Olímpicos de Verão” de 1936 na Alemanha hitlerista.
Quem poderá ocultar a relação entre o futebol
brasileiro (o sucesso na Copa do Mundo de 1970), a ditadura militar no Brasil e
o aumento da tortura (do desaparecimento e assassinato) dos presos políticos
dentro das prisões dirigidas pelos militares?
Quem poderá negar que “as boas relações políticas”
entre a ditadura militar brasileira, João Havelange e o genro Ricardo Teixeira,
conduziram João à presidência da FIFA, e Ricardo, a presidência da CBF? Assim,
quem poderá esconder que, como presidentes da FIFA e da CBF, os corruptos e
corruptores Havelange e Teixeira realizaram uma das políticas mais desgraçadas da
história do futebol Internacional e nacional? Tratar de não ver, esquecer, ou
negar todas essas relações entre o esporte e a política me parece simplesmente
uma grande estupidez.
A relação entre futebol, política e religião, também
pode ser mostrada através de um exemplo para a geração mais jovem: quando o
famoso futebolista brasileiro Cacá (ex-membro da Igreja Universal do Reino de
Deus, um milionário jogador do Real Madrid) depois de fazer um gol, olha pro
céu, faz o sinal da cruz e agradece ao suposto “Deus”, (pretendendo que “Deus”
está do seu lado e do lado da sua equipe), a maioria dos católicos ou
protestantes não questionam a atitude de Cacá (ou de outros jogadores). Pelo
contrário, esses religiosos afirmam que é uma atitude “normal”, “natural” ou
“inocente”, completamente isenta de conotação política ou religiosa.
Mas esta afirmação, dos católicos e dos protestantes, não
é epistemologicamente correta, e me parece eticamente desonesta. Na minha
opinião, quando Cacá pretende que Deus está do seu lado, está fazendo política:
política econômica e política religiosa.
No plano religioso, quem, atualmente, poderá negar as
estreitas relações entre a Igreja Católica, (padres, bispos, arcebispos,
cardeais e o Vaticano) à Máfia italiana e a organização política maçônico-
fascista conhecida por “Propaganda 2”?
Quem
poderá ocultar que a principal ocupação e objetivo da Igreja católica é
conseguir mais poder e riqueza, pois ela é uma das instituições mais ricas e
poderosas do mundo (veja o escândalo do Banco do Vaticano e do Banco Ambrosiano)
e sua preocupação crucial é como evitar pagar indenizações às famílias cujos
filhos(as) foram violados ou abusados sexualmente por autoridades católicas praticantes
de pedofilia?
Por último, tratarei de responder aos leitores do
grupo 3: - Creio que reduzir a discussão esportiva sobre Cristiano Ronaldo às
perguntas: Quem é melhor jogador, Messi ou Ronaldo? Quem é melhor, Cristiano
Ronaldo ou Cacá?, é simplesmente uma grande bobagem.
Pessoalmente, penso que na área futebolística, Leonel
Messi é um gênio, e os excelentes Cristiano Ronaldo e Cacá não o são, mas a
discussão, a rivalidade, a briga de egos, podem ser emocionantes para os
fanáticos, mas para mim, é uma grande perda de tempo. Como disse o inteligentíssimo e falecido
jogador brasileiro Sócrates a respeito da velha discussão de mais de 30 anos
(quem é melhor, Pelé ou Maradona?): “Este tipo de questão, é uma besteira...”
“Essa briga de egos... é uma briga estupida.”
Concordo com o jogador Sócrates e não entrarei na
briga de egos entre Messi e Cristiano, mas continuarei aplaudindo, na área da
solidariedade humana, ao extraordinário Cristiano Ronaldo. Por que? Porque no
afã de ajudar a um povo oprimido colocou sua bota de ouro num leilão publico
para arrecadar dinheiro. Assim. o
dinheiro arrecadado (um milhão e meio de euros) foi doado por ele à Palestina para
ajudar às vítimas dos bombardeios israelenses.
Agora podemos começar a entender porque a atitude e a
fala de Cristiano Ronaldo não foram divulgadas pelos meios de (des)informação
do Brasil: como sempre, a mídia corporativa brasileira e de outros países
ignorou, escondeu ou evitou a publicação da declaração de Cristiano Ronaldo
para não contrariar o poder dos EUA e de Israel: Cristiano Ronaldo, é um jogador famoso,
querido, reconhecido e respeitado em todo o mundo pelo talento,
inteligência, sensibilidade, riqueza e
fama. E não é bom para os donos do poder que se divulgue pelo mundo que ele
está defendendo os palestinos contra a injustiça e a barbaridade do estado de Israel
e dos EUA.
Mas o silencio não é a única tática para sabotar a
atitude valente do jogador português contra a política criminosa de Barack
Obama e Natanyahu para a Palestina..
Outra forma usada pelo governo dos EUA, pela mídia
corporativa e pelo American-Israel Public
Afair Commit, AIPAC (o lobby
judeu que controla a política externa dos EUA) para denegrir a CR é chama-lo de
anti-semita. Aliás, esta é a forma mais eficiente (usada sistematicamente pelo
governo, pela media coorporativa e pela AIPAC), para denegrir aos intelectuais,
aos atletas, aos artistas famosos e a
toda gente decente que tem tido a coragem de criticar o apartheid criado pelo sionismo de Israel com a cumplicidade dos
EUA. Brilhantes personalidades intelectuais e políticas como o finado Edward
Said, Noam Chomsky, Cornel West, James Petras, o ex-presidente James Carter tem
sidos chamados de anti-semitas e
atacados virulentamente por se oporem ao sionismo e defender aos
palestinos.
Recentemente, o presidente Barack Obama fez um discurso para os membros
da IAPAC (e para o povo norteamericano), que evidencia eloquentemente o que
venho afirmando neste texto: que a ausência no Brasil da notícia sobre a
declaração de Cristiano Ronaldo estar relacionada com a subserviência (e o
temor) da nossa mídia corporativa ao poder dos EUA e Israel.
Sem mostrar o mínimo de vergonha,
Barack Obama, nesse discurso, se auto proclamou agente político financiado pela
AIPAC para servir aos interesses de Israel. Vejam e constatem com seus próprios
olhos, o caráter entreguista da oratória do governo do presidente dos EUA:
“O fato é que o
compromisso do meu governo com a
segurança de Israel tem sido sem precedentes.
Nossa cooperação militar e de inteligência nunca esteve tão próxima. Nossos exercícios conjuntos e de formação
nunca foram mais robustos.
Apesar do nosso ambiente de orçamento
difícil, a nossa assistência de
segurança tem aumentado a cada
ano. E assim como nós estivemos
lá: com a nossa assistência à segurança de Israel
e através da nossa diplomacia. Quando o “Relatório Goldstone”
(1) criticou injustamente a Israel, nós o desafiamos. Quando Israel
foi isolado pelo rescaldo do incidente da flotilha, nós apoiamos Israel. Quando a Conferência
de Durban foi comemorada, nós a boicotamos,
e sempre rejeitamos a noção de que sionismo é racismo. Quando as resoluções unilaterais
são criadas no Conselho
de Direitos Humanos da ONU, nós nos opomos a eles.
Quando os diplomatas israelenses temiam por
suas vidas no Cairo, nós intervimos para salvá-los. Quando existiram esforços para boicotar
ou alienar Israel,
nós ficamos contra eles. E sempre que iniciativas forem feitas para
deslegitimar o estado de Israel, a minha administração tem se oposto às mesmas. Portanto, daqui
pra frente não deve haver a mínima sombra de dúvida: quando as fichas estiverem em baixa,
contarei com o apoio de Israel.” (2)
Notas:
1)
Em 1º de junho
de 2009, uma comissão do Conselho de Direitos
Humanos da ONU, chefiada pelo juiz judeu sul-africano
Richard Goldstone,
chegou à Faixa de Gaza, para investigar possíveis violações dos direitos humanos
durante a ofensiva israelense contra os palestinos. Em 15 de setembro
de 2009,
a comissão, mesmo sendo comandada por um judeu sionista, apresentou seu
relatório, concluindo que Israel "cometeu
crimes de guerra e, possivelmente, contra a humanidade", e que, "embora o governo israelense tenha
procurado caracterizar suas operações essencialmente como uma resposta aos
ataques de foguetes, no exercício do seu direito de autodefesa, a comissão
considera que o plano visava, pelo menos em parte, um alvo diferente: a
população de Gaza como um todo.
2) Este é o discurso original do Presidente
Barack Obama:
“The fact is, my administration’s commitment to Israel’s security has been
unprecedented. Our military and intelligence cooperation has never been closer.
Our joint exercises and training have never been more robust. Despite a tough
budget environment, our security assistance has increased every single year.
And just as we’ve been there with our security assistance, we’ve been there
through our diplomacy. When the Goldstone Report (1) unfairly singled out
Israel for criticism, we challenged it. When Israel was isolated in the
aftermath of the flotilla incident, we supported them. When the Durban
Conference was commemorated, we boycotted it, and we will always reject the
notion that Zionism is racism. When one-sided resolutions are brought up at the
Human Rights Council, we oppose them. When Israeli diplomats feared for their
lives in Cairo, we intervened to save them. When there are efforts to boycott
or divest from Israel, we will stand against them. And whenever an effort is
made to delegitimize the state of Israel, my administration has opposed them.
So there should not be a shred of doubt by now. When the chips are down, I have
Israel’s back.”