quarta-feira, 15 de junho de 2011

Afinal, por que EUA e seus aliados não conseguem derrubar Kadafi? Por que o povo líbio criou milícias armadas e insiste em defender o ditador?


Li esta matéria hoje na Tribuna da Imprensa e achei por bem transcrevê-la. Fez-me pensar mais profundamente porque as potências ocidentais se interessaram pela derrubada de Kadafi com tanta força, intervindo e investindo pesadamente com a sua força militar contra aquele governo, não apenas por ser “ditatorial”, mas porque, como Solano Lopes no Paraguai, tentou um caminho próprio de independência.
O que não acontece nos demais países da região em que os governos (também ditatoriais) servem aos interesses do capitalismo imperialista ocidental.

Carlos Newton
A impressionante resistência do povo da Líbia é facilmente justificável, mas a imprensa ocidental não dá explicação alguma, limita-se a fazer uma espécie de diário da guerra, citando os pontos bombardeados pela aviação americana, inglesa, francesa e italiana, relacionando o número de vítimas etc., e estamos conversados. Esta é a cobertura da mídia.
Nenhum jornal ou televisão explica que a união do povo líbio em torno de Muhamar Kadafi é fruto de sua própria forma de governo, bem diferente dos demais países árabes que exportam petróleo. Segundo o jornal britânico “Financial Times”, até o início da guerra civil alimentada pelo Ocidente, os líbios tinham o rendimento per capita mais alto de África, com 14.900 dólares por ano. Você sabia?
Além disso, há muitas outras informações que ardilosamente são ignoradas pela imprensa ocidental. Por exemplo, o fato de que o regime de Kadafi vinha utilizando a riqueza petrolífera do país para construir uma ampla rede de escolas, hospitais e clínicas públicas. Assim, dezenas de milhares de estudantes líbios de baixos rendimentos receberam bolsas para estudar no seu país e no estrangeiro. Ao mesmo tempo, as infraestruturas urbanas estavam sendo foram modernizadas, a agricultura era subsidiada e os pequenos produtores e fabricantes recebiam créditos do governo.
Ao contrário de outros ditadores árabes, Kadafi não se preocupou apenas em enriquecer a sua própria família/clã, promovendo também programas eficazes de desenvolvimento, mas agora está tudo em risco, com os bombardeios diários e com os ataques dos rebeldes, que são bancados e incentivados pelo Ocidente.
Na verdade, os rebeldes e os seus mentores estão destruindo a Líbia, arrasando toda a economia, bombardeando importantes cidades e destruindo a infraestrutura do país e tudo o mais. Ao mesmo tempo, bloqueiam a entrega de alimentos subsidiados e assistência aos pobres, provocam o fechamento das escolas e forçam milhares de profissionais, professores, médicos e trabalhadores especializados estrangeiros a fugir do país.
A imprensa ocidental não explica que os líbios, mesmo os que se opunham à prolongada permanência de Kadafi no poder, encontram-se agora perante a escolha entre apoiar um estado de bem-estar social, evoluído e que funcionava, ou apoiar uma aventura militar manobrada por estrangeiros. Compreensivelmente, muitos deles escolheram ficar do lado do regime.
O fracasso das forças rebeldes apoiadas pelo Ocidente, apesar da sua enorme vantagem técnico-militar, deve-se à destruição insensata desse sistema de bem-estar social que vinha beneficiando milhões de líbios desde duas gerações.
A incapacidade de os rebeldes avançarem, apesar do apoio maciço do poder ocidental aéreo e marítimo, significa que a “coligação” EUA-França-Inglaterra-Itália terá que reforçar sua intervenção e desembarcar as tropas, invadindo o país em desrespeito às determinações das Nações Unidas, se é que realmente pretendem ganhar a guerra e dominar a produção de petróleo, sejamos francos.
Na verdade, a intervenção estrangeira exacerbou a consciência nacionalista dos líbios, que passaram a entender sua confrontação com os rebeldes anti-Kadafi como uma luta para defender sua pátria do poderio estrangeiro aéreo e marítimo e das tropas terrestres fantoches – um poderoso incentivo para qualquer povo ou exército. E o raciocínio oposto também é verdadeiro para os rebeldes, cujos líderes abdicaram da sua identidade nacional e dependem inteiramente da intervenção militar ocidental para chegarem ao poder.
Mas a tendência é de enfraquecimento das tropas rebeldes, porque muitos jovens líbios devem acabar abandonando a luta contra seus compatriotas, ao perceberem que o que fazem é tentar colocar o país sob um domínio neocolonialista, contra a vontade do povo, a pretexto de derrubarem Kadafi.
Enquanto isso, na Síria, no Iêmen e em outros países árabes o banho de sangue também continua, unindo cada vez mais os islamitas contra os ditadores apoiados pelo Ocidente, transformando aquela riquíssima região numa gigantesca bomba-relógio que um belo dia vai explodir, marcando o tempo da guerra santa com que os  muçulmanos tanto sonham.

6 comentários:

André Setaro disse...

Também já tinha lido, porque diariamente acesso o site da 'Tribuna', que agora se chama 'Tribuna da Internet'. A conclusão é também óbvia: o propósito de tudo é roubar o petróleo alheio. E os meios de comunicação mistificam, nada informam dos fatos verdadeiros. Daí, para se saber a verdade, a necessidade de ler o referido site.

Jonga Olivieri disse...

Sim, por foça do hábito escrevi "Tribuna da Imprensa", mas o Helio Fernandes saturado de seus processos contra o governo desde os de censura quanto o criminoso incêndio que não têm uma solução, resolveu deixar o jornal, mesmo em sua edição internautica.
Mas são poucos os veículos da imprensa, escrita ou falada que abordam esta questão da Líbia com a simplicidade realística que nesta matéria...

Joelma disse...

Gente, desde que os Estados Unidos atacaram a Líbia eu juro que fiquei com a pulga atrás da orelha!

André Setaro disse...

Uma pena a saída de Hélio Fernandes, que não tinha papas na língua e falava dos podres do poder.

Jonga Olivieri disse...

Idem, Joelma. Passou-me de imediato algo mais ou menos como lia nos quadrinhos quando criança, a expressão: "Aí tem dente de coelho!". Uma expressão tão comum nos "gibis" da vida.
Mas é isso mesmo. Se os EUA atacam alguém, é como dizer que este alguém tem alguma coisa de bom ou contra os interesses do imperialismo.
Simples... Muito simples mesmo!

Jonga Olivieri disse...

Helio Fernandes é um grande jornalista e ensaista. Ao longo de sua carreira, desde que tomou as rédeas da "Tribuna" foi um opositor à ditadura militar e foi tmando posições à esquerda no cenário político pós aquele regime de excessão.
Também, como leitor do jornal, depois blogue na internet, sinto falta de suas apaixonadas defesas e ataques...
Costumo dizer que seu grande defeito (todos os temos) foi manter a admiração por Carlos Lacerda, o "Corvo", a figura mais heedionda da história do Brasil...