André Breton, Diego Rivera e Leon Trotsky no histórico encontro |
“Em matéria de criação artística,
importa essencialmente que a imaginação escape a toda sujeição, não se deixe
impor filiação sob nenhum pretexto. Àqueles que nos pressionam, hoje ou amanhã,
para que consintamos que a arte seja submetida a uma disciplina que sustentamos
radicalmente incompatível com seus meios, pomos uma recusa inapelável, e nossa
deliberada vontade de nos manter no lema: todas as licenças em arte.”
André Breton e Leon Trotsky
André Breton e Leon Trotsky
Trotsky e Breton escreveram, no ano de
1938, o manifesto “Por uma arte
revolucionária independente”, quando o mundo encontrava-se às portas de
mais uma guerra entre potências imperialistas, que nas armas queriam conquistar
a hegemonia do mundo.
Para a arte, o Stalinismo elaborou o realismo socialista, fazendo da arte um
mero objeto nas mãos dos burocratas que dirigiam o partido e a nação,
transformando os artistas em meros paisagistas da construção de uma sociedade
que era caricatura daquela que os Bolcheviques se propuseram a construir quando
dirigiram os processos revolucionários de 1917.
Este é o momento em que Trotsky volta
a se dedicar ao debate sobre os rumos da arte e sua relação com a revolução
socialista. As idéias outrora defendidas em “Literatura e Revolução” (1), 1924, eram não apenas resgatadas como eram
reformuladas, seja pelo amadurecimento teórico e político do revolucionário
russo ou pelas discussões com o poeta surrealista francês André Breton, que
muito o admirava. Fruto dos encontros entre Trotsky e Breton é o manifesto de
fundação da Federação Internacional da Arte Revolucionária Independente chamado
“Por uma arte revolucionária independente”.
Nele, Trotsky e Breton denunciavam o
movimento que faziam as potências imperialistas rumo à guerra mundial, ressaltando
que o capitalismo seja em sua face “democrática”, seja em sua face totalitária,
são lados diferentes da mesma moeda. Além disso, mostravam o que o capital fazia
em relação à arte e comparavam às atrocidades que também fez o Stalinismo na URSS.
Avançaram mais, defendendo como revolucionária toda a arte que seja
independente.
O texto final foi assinado
por Leon Trotski e André Breton na cidade do México no dia 25 de julho de 1938,
e, em resumo suas principais propostas eram:
•
Uma aliança
em prol da civilização, da vida e do ser humano em sua plenitude de
manifestações.
•
Nenhuma
barreira, nenhum tipo de controle, nenhum limite aos sonhos, à cultura ou à
arte, que todos nascem no mesmo lugar.
•
Um libelo
pela mais plena e absoluta liberdade de expressão, sem qualquer tipo de
amarras.
•
O mais
vigoroso repúdio a toda e qualquer forma de autoritarismo ou dirigismo.
•
Os meios
materiais devem ser postos sem limite ou controle de qualquer espécie a serviço
do ser humano e da arte.
•
Se destruir
uma obra de arte é considerado por todas as pessoas sensíveis um gesto
hediondo, como classificar o gesto de impedi-la de sequer existir...
•
Repúdio à
barbárie das guerras e do autoritarismo.
Mas, se, por um lado, o proletariado, até 1945, não conseguiu
nenhuma vitória de fato (conforme Lênin e Trotsky esperavam), não pôde, por
outro, criar, dentro da União Soviética, uma literatura e uma arte próprias. As
obras do realismo socialista refletiram, pela sua mediocridade, não o
desenvolvimento de uma cultura proletária, mas a degenerescência burocrática,
que se cristalizou no Stalinismo, exatamente por causa do atraso da revolução
mundial, a literatura e arte daquele período se formaram à imagem e semelhança
da burocracia.
1. Leon Trotsky escreveu “Literatura e
revolução” nos verões de 1922 e 1923, depois de um período de guerra civil
intensa na Rússia para sedimentar o poder do socialismo. Nessa obra, embora
concentrado na produção literária de seu país, Trotsky estende seu olhar
crítico sobre as manifestações artísticas dominantes na Europa de seu tempo.
O partido revolucionário,
no seu entender, não deveria interferir nas controvérsias e nas disputas entre
as diversas escolas, assumir a posição de um circulo literário, concorrendo com
outros, mas salvaguardar os interesses históricos do proletariado, no seu
conjunto. Como que prevendo a degenerescência do Stalinismo, que,
posteriormente, criou uma arte oficial, na verdade acadêmica e burocrática, sob
o epíteto de realismo socialista, Trotsky
proclamaria: “a arte não constitui um terreno onde o Partido possa mandar. O
Partido pode e deve conceder um crédito de confiança aos diversos grupos que
procurem, sinceramente, aproximar-se da revolução, afim de ajudá-los na sua
realização artística”.
O livro, publicado
pela primeira vez no Brasil em 1968, pela Zahar Editores, inclui os três ensaios
de Trotsky sobre os poetas Maiakóvski e Iessênin, e um sobre Lunatchárski. A tradução
foi assinada Luiz Alberto Moniz Bandeira, doutor em ciência política pela USP.
10 comentários:
Três revolucionários reunidos: André Breton, papa do surrealismo, Diego Rivero, o grande pintor de painéis, e Leon Trotsky, o revolucionário exilado. Não se poderia esperar outra coisa senão um manifesto da conjunção Breton-Trotsky, um manifesto revolucionário e em pró de uma arte viva e participante. Gostei muito do que li.
E a questão da arte é que se constituiu mum dos grandes fiascos visíveis do Stalinismo...
Era evidente o caráter utilitarista/populista/demagógico do "realismo socialista", uma verdadeira presopopéia pseudo poética, com claros contornos fascistóide.
O manifesto divulgado por Breton e Trotsky -citado nesta postagem- foi a chamada decisiva à construção da ”Federação Internacional da Arte Revolucionária e Independente - FIARI”.
A título de esclarecimento, os adversários de Breton o chamavam "ironicamente" de "papa do surrealismo". Na verdade, se ele teve uma influência decisiva sobre este movimento artístico, jamais se considerava isolado, jamais se intitulava o "chefe", porque toda ideia de imposição, seja militar, clerical ou social, suscitava-lhe uma grande revolta.
Neste sentido Breton se identificou com Trotsky, dado o caráter aberto deste à arte e à visão de arte de um ponto vista realmente revolucionário.
É muito bom saber de tudo isso!
Sin duda Jô!
Breton foi importante. Trotsky mais ainda. Mas somados tiveram o que acrescentar as artes no século 20.
L.P.
Nem sei se é por aí, Luis. Na verdade não é para se comparar importências e sim saber que se posicionaram juntando seus esforços e influências contra a monstruosidade do "realismo socialista"... Uma verdadeira aberração...
Importantísssimo este post.
Tambem acho Mário...
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