segunda-feira, 17 de setembro de 2012

E por que não inventar o próprio estilo?


“Se a uma ordem internacional nos tornamos “hippies” ou psicodélicos, também podemos inventar a nossa própria ordem, o nosso estilo.
 
Se essa nova ordem chegou para ficar, impossível garantir. Mas muitas garotas de Ipanema inscreveram-se para disputar o título de ‘Miss Banana Real’ e no próximo mês de maio o bairro vai viver ‘10 dias de Tropicália’, numa promoção de Roberto Braga. A Praça General Osório será enfeitada com bandeiras e quadros tropicalistas e os homens estarão de terno branco de tropical, lapelas largas e chapéu de palhinha. Gravata berrante, lenço com três pontas e sapato de duas cores, além de calça vincada. As mulheres com trajes laranja, turquesa e maravilha. Vestidos rodados e cabelos cheios de laquê. E anáguas imensas e coloridas. A música famosa de Gil, Capinam e Veloso está sendo cantada em toda a América do Sul, no que parece uma excelente oportunidade de diálogo musical com nossos vizinhos. Surge o mito do tropicalismo, no qual o conformismo é alguma coisa inteiramente por fora dos seus objetivos. “

O texto acima, publicado na época (1) reforçava um dos maiores movimentos artísticos do Brasil que ganha vida no filme “Tropicália” e nos trás de volta uma época em que a liberdade de expressão perdia força frente ao fortalecimento da ditadura militar, e na contramão a criatividade crescia... E aparecia!
  
É emocionante reviver a saga de Caetano, Gil, Gal, Arnaldo Baptista, Rita Lee, Tom Zé, Chacrinha, Capinam, em misturar desde velhas tradições populares a muitas das novidades artísticas ocorridas pelo mundo (como os Beattles) e criarem o Tropicalismo, abalando a fundo as estruturas da cultura brasileira (2). O Tropicalismo, não possuia exatamente uma ideologia ou uma estética. Sua preposição seria encontrar uma forma de expressão coerente com a realidade brasileira, mostrar as coisas como elas eram realmente, sem manter a mistificação contínua.
  
Mas o professor Maurício Vinhas de Queirós, sociólogo pesquisador do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, prefere considerá-lo um “nacionalismo de epiderme consentido, um tanto para inglês ver. Uma espécie de saudosismo disfarçado dos tempos da senzala. (Ao lado do Chacrinha, o Sr. Gilberto Freyre não será também um tropicalista?)” E propunha que nos comportássemos como os ianques mais preconceituosos julgam que no fundo sempre fomos: “Yes, nós temos banana”. Porque no Tropicalismo não havia nacionalismo exacerbado, mas sim uma tentativa de assumir uma visão crítica da realidade brasileira. Não da realidade que alguns fingiam existir, mas de alguma coisa que, se é cafona, de mau gosto ou grossa deveria ser assumida e criticada dessa maneira e através desse caminho. 
  
Um dos manifestos Tropicalistas divulgados pregava a exaltação dessa mesma banana e de tudo o mais que é nitidamente tropical, tentando uma derrubada da cultura brasileira calcada na européia e estadunidense. O mesmo que, em 1922, Oswald de Andrade concluía no seu “Manifesto Antropofágico”, quando preconizava a necessidade de reduzir todas as nossas influências culturais externas a modelos nacionais, numa defesa do colonialismo cultural. Hélio Oiticica está inteiramente de acordo com este pensamento. Ele também prega que só o índio e o negro brasileiro não se submeteram a influências estrangeiras e que são eles que, antropofagicamente podem absorver tais influências, sem o que a arte brasileira seja híbrida, intelectualizada ao extremo e vazia de significado. E vai mais longe: lembra que o “mito da tropicalidade é muito mais que araras e bananeiras: é a consciência de um não condicionamento às estruturas estabelecidas, portanto altamente revolucionária na sua totalidade”. 
  
Com depoimentos, alguns reveladores, raras imagens de arquivo e embalado pelas mais belas canções do período, o filme "Tropicália" nos dá um panorama definitivo desse fascinante movimento musical no Brasil.
  
Do diretor, Marcelo Machado eu não conhecia nada, embora já houvesse realizado “Ginga”, uma co-produção Brasil/Estados Unidos (2005), bastante desconhecida sobre futebol, no qual dividiu a direção com Tocha Alves. Se quiser assistir o trailer, clique no link abaixo:

1. Tropicalismo: movimento, mito, escola ou cafajestada sob encomenda? Arlette Neves – Revista “O Cruzeiro” 20 de abril de 1968.
  
2. Como a “Semana de Arte Moderna” o “Tropicalismo” foi uma verdadeira proposta ”antropofágica” musical. 
  
  

5 comentários:

Anônimo disse...

Como foi importante este movimento.
Apesar de descompromissado político-ideologicamente abalou as estruturas daqueles "anos quadrados" e enquadrados pelos militares. Tanto que eles acabaram banidos.
Vou ver o filme.
L.P.

Joelma disse...

Cae sempre foi um pequeno-burguês vacilante, sexual e ideologicamente. Gil tinha (e tem atá hoje) uma postura mais definida; tanto sexualmente quanto do ponto de vista da ideologia.
O que os dois têem é sensibilidade. Isso ao extremo mesmo.
Vou assistir este filme; Principalemnte depois do que você fallou!

Manuel Pinto disse...

Sempre amei a verdadeira irreverência do "Tropicalismo".
Tanto quanto detestava a falsa da "Jovem Guarda", esta símbolo da alienação sob a guarda dos milicos.

Mário disse...

Impressionante como fica evidente no que explica muito bem a Joelma, o vacilo de Caetano. Aliás até hoje, ele, do ponto-de-vista político oscila ora pra lá, ora pra cá. Já apoiou o Gabeira e agora está com o Freixo. Até passo a desconfiar do candidato do Psol.
Vou assistir o filme, apesar de que um conhecido meu disse que as imagens são muito ruins.

Jonga Olivieri disse...

As imagens não são de fato nada boas... Pelo menos na maioria. Até porque já lá se vão mais de 40 anos que aconteceram.
VTs eram deficientes e P&B naquela época.
E o filme é todo editado em vídeo...