domingo, 21 de dezembro de 2014

Pensatas de domingo. Por que PSDB e PT estão mais similares?



Candidata à Presidência da República nas eleições deste ano, a gaúcha Luciana Krebs Genro não figurou entre as favoritas na disputa, mas fez barulho na campanha. Era sempre uma das mais comentadas nas redes sociais, especialmente após os debates promovidos pelas emissoras de TV. Em um deles, disparou contra o tucano Aécio Neves, que havia definido o PSOL (partido de Luciana) como “linha auxiliar do PT”. “Linha auxiliar uma ova”, bradou para em seguida acusar os tucanos de serem os “precursores do mensalão com Eduardo Azeredo em Minas Gerais, terra de Aécio”.
Passada a campanha, Luciana continua com intensa agenda política, levando a mensagem do PSOL Brasil afora. Na semana passada, esteve em Belém para discutir temas do cenário atual brasileiro em um encontro com jovens lideranças políticas e representantes de movimentos sociais. Foi tratada como uma verdadeira celebridade durante evento na área de lazer da Universidade Federal do Pará, o famoso Vadião. Entre um compromisso e outro, falou com exclusividade ao DIÁRIO DO PARÁ. Confira:


P: Depois da eleição continua polarização forte entre tucanos e petistas. Como a senhora analisa esse cenário?
R: Eu vejo que há uma polarização artificial que não reflete de fato o conteúdo político, e principalmente, o modelo econômico que é representado pelo PT e pelo PSDB. As decisões que a [presidente] Dilma [Rousseff] tomou depois do segundo turno - no qual, ela teve um embate duro com o Aécio [Neves] - foram muito semelhantes àquelas que o Aécio tomaria se tivesse sido eleito. A escolha do Joaquim Levy como ministro da fazenda é um exemplo muito eloquente disso. O Joaquim Levy é justamente o executivo do Bradesco e alguém que teve relações muito sólidas com o PSDB, inclusive, tendo trabalhado dentro do governo do PSDB de São Paulo. Então, as medidas que ela tomou como o aumento da taxa de juros, o aumento da gasolina, o anúncio do ajuste fiscal são muito parecidas com as medidas que o PSDB tomaria. Só que obviamente, o PSDB não pode assistir calado o PT se apropriar do seu programa, então precisa se contrapor, mesmo que de forma artificial. É está, inclusive, querendo um aprofundamento ainda maior das medidas de ajuste fiscal que a Dilma está tomando.

P: A gente tem a impressão de que há um vácuo em termos de oposição. Por que o Psol ainda não assumiu esse lugar?
R: Primeiro, é preciso dizer que o Psol cresceu muito nessa eleição. Dobramos a nossa votação em relação a 2010, quase dobramos nossa bancada federal, dobramos o número de deputados estaduais. Foi um crescimento muito expressivo. Um milhão e seiscentos mil votos para Presidência do Brasil. Obviamente que a disputa eleitoral é muito desigual. A minha campanha teve R$ 450 mil de gastos. A campanha da Dilma teve R$ 390 milhões. Então, o que eu gastei na campanha inteira, a Dilma gastava em 24 horas, e o Aécio também. Isso dificulta muito. A eleição é uma expressão muito distorcida da vontade popular, porque está mediada, primeiro, pelo poder econômico e, segundo, pela mídia, que também representa os poderes econômicos. Além do mais não se pode comparar esse momento político com o momento em que o PT fez oposição ao PSDB. O PT galvanizava toda a oposição ao governo, e ao chegar ao poder, a oposição ao PT se divide em duas: de um lado, o PSDB que tem todo o poder econômico, toda a mídia trabalhando ao seu favor e, do outro lado, a oposição de esquerda, que não tem dinheiro, que não tem poder econômico, que não representa esses interesses.

P: Tem havido uma polarização grande também em aspectos sociais e comportamentais, com o aparecimento de grupos muito conservadores em questões como maioridade penal, aborto, questões feministas e a pauta GLSBT. Na sua opinião, o Brasil está se tornando um país ainda mais conservador?
R: Eu acho que é o contrário. E polarização é um sinal de que as pautas progressistas estão avançando. Preconceito contra gays sempre houve no Brasil; piada de gay sempre foi a coisa mais normal, não é? Por outro lado agora, os movimentos LGBTS estão exigindo respeitos aos homossexuais, aos gays, às lésbicas aos travestis. São marchas que tomam conta do Brasil de forma muito numerosa, não só dos que são da comunidade LGBTS, mas dos que apoiam essa luta. A mulheres também sempre foram oprimidas, descriminadas. Até hoje, as mulheres ainda ganham salários menores do que os homens. Até hoje a mulher é colocada como aquela que tem a obrigação de tomar conta da casa dos filhos. Elas estão se rebelando contra essa condição, e estão lutando pelo seu lugar, seu espaço. Eu acho que é isso. Digamos que as placas tectônicas estão se movimentando. A polarização que aparece é um resultado dessas lutas que estão avançando e os setores reacionários, conservadores, também levantam a cabeça para defender a sua pauta, para defender o status quo.

P: O Congresso recém-eleito, que ainda não assumiu, tem o perfil mais conservador da história recente. Como se explica isso nesse contexto de avanços?
R: Eu acho que a gente não pode ser impressionista. Nomes como Bolsonaro [Jair Bolsonaro, deputado federal reeleito] e Marcos Feliciano catalisam toda uma votação de direita que existe no Brasil, e que se concentra neles. Já os nomes progressistas que defendem as pautas LGBTS, das mulheres, da juventude, são muito numerosos e não têm essa visibilidade que figuras como Bolsonaro e Feliciano têm. Não conseguem concentrar tanto essa votação. Há exceções como é o caso do Jean Wyllys [deputado pelo Psol] no Rio de Janeiro e do Marcelo Freixo [deputado estadual também do Rio de Janeiro e do Psol]. A gente tem outros nomes que fortes nos seus estados e que muitas vezes não conseguem se eleger porque não têm essas estruturas partidárias e econômicas que nomes como Bolsonaro e Feliciano têm. É verdade que a bancada conservadora de direita cresceu, mas ela vem crescendo desde 2006. E o que que aconteceu em 2005 que desencadeou o crescimento das bancadas de direita? O Mensalão. Então, é na esteira de uma esquerda que abandonou suas bandeiras, que não é mais digna de ser chamada de esquerda, que a direita cresce. À medida que as pessoas se decepcionam com o PT, elas buscam uma alternativa. Como elas não enxergam ainda de uma forma tão clara uma alternativa pela esquerda, acabam votando em outros candidatos contra o PT e acabam fortalecendo a direita, mesmo que elas não tenham uma ideologia de direita. Então, eu acho que a gente tem que olhar com cautela essa correlação de forças no congresso. Embora ela reflita sim, um crescimento da direita, do conservadorismo, não significa que o Brasil está indo à direita, e nem que as forças da direita estejam mais fortes.

P: O Psol é acusado de, muitas vezes, ajudar os partidos mais conservadores ao atacar o PT com frequência. Como a senhora responde a essa acusação?
R: Isso é uma acusação totalmente infundada, porque não há como fazer um bloco de esquerda com o PT. Hoje o PT é o principal aplicador dos planos capitalistas, dos interesses do grande capital, dos bancos, das empreiteiras. Olha o que está acontecendo com a Petrobras e não é restrito a Petrobras. O PT manteve toda a política herdada, não só de Fernando Henrique, mas da história política do Brasil, de fazer com que grandes empreiteiras dominem o Estado e se beneficiem de obras superfaturadas, dando propina para os políticos. O PT manteve essa mesma lógica, assim como manteve a política economia sobre a subserviência do Brasil aos interesses dos mercados, pagando altas taxas de juros na divida pública. O PT não fez uma auditoria, não enfrentou esse problema da dívida, que outros países como Argentina e Equador enfrentaram. Então, o PT não é um partido de esquerda na sua essência mais. Ele pode se dizer de esquerda, qualquer um pode se dizer, mas na essência não é. A política que ele implementa não é uma política de esquerda. Então, não há como fazer um bloco com o PT contra a direita, até porque a direita também está dentro do governo com o PT. O que é a Kátia Abreu [senadora cotada para assumir o Ministério da Agricultura] se não direita? O que o Joaquim Levy é, se não é direita? Então, o que a gente precisa é justamente se construir de forma independente, enfrentando toda essa dificuldade que a gente tem que é a estrutura financeira e a grande mídia, tentar dar visibilidade para uma oposição de esquerda.

P: As pautas tradicionais da esquerda não estão meio fora de moda?
R: Que pauta tu achas que está fora de moda?

P: A implantação do socialismo, por exemplo. A esquerda não deveria buscar novas pautas como questões de gênero, etnia, dos jovens? 
R: Eu acho que essas pautas que tu dizes não são novas porque são lutas que já vêm sendo travadas há muito tempo, mas que ganharam força justamente pela força social que esse setor tem, como as mulheres, os movimentos s LGBTS, a juventude com essa pauta das drogas, por exemplo. São pautas fundamentais, mas as pautas econômicas são essenciais. Sem elas não se caracteriza uma esquerda coerente. O que eu concordo contigo é que a ideia do socialismo está desgastada porque os modelos apresentados como socialistas fracassaram. União Soviética, China, Cuba, fracassaram por diferentes razões, em diferentes contextos. Tiveram avanços econômicos importantes, mas não conseguiram contemplar pautas democráticas que são fundamentais. Então, é preciso construir um novo modelo. Nós não temos um modelo para apresentar e dizer “esse aqui é o modelo do socialismo que nós queremos construir”. Não existe isso. Na campanha eleitoral - e eu acho que isso foi o que deu força pro Psol, em comparação por exemplo, com o PSTU, que também é um partido com o qual a gente tem afinidade programática, é que nós não nos fixamos em uma proclamação do socialismo. Nós apresentamos medidas concretas, que são na verdade reformas radicais que se contrapõem objetivamente ao capitalismo, mas que não são medidas diretamente socialistas. Por exemplo, reforma agrária, reforma urbana, taxação de grandes fortunas. Todas são medidas dentro do modelo capitalista. A gente dialogou com as questões objetivas do povo, os problemas concretos e não simplesmente fazendo proclamação do socialismo.

P: Como foi a experiência da campanha presidencial, principalmente no que diz respeito à sua fama nas redes sociais?
R: Para mim, foi uma experiência muito gratificante. Eu me fortaleci, a partir da própria energia que as pessoas me passavam. Foi uma campanha muito difícil, sem estrutura sem dinheiro, sem tempo na TV, com a mídia nos boicotando permanentemente. Por exemplo, no Jornal Nacional, todos os dias, estavam a Marina, o Aécio e a Dilma. Eu aparecia de 15 em 15 dias. Então é duro enfrentar uma campanha dessa forma, mas por outro lado, quando eu ia para as ruas, universidades, escolas, locais de eventos, sentia uma energia muito grande, principalmente da juventude e da comunidade LGBTs, que foram duas pontas de lança, da minha votação e da minha campanha.

2 comentários:

Joelma disse...

Continuo me arrependendo de não ter votado nela.
Cada vez nais acho que o PSOL se modernizou. É uma esquerda atualizada com o mundo.
Obrigada por me mostrar isso!
Fique certo que nas próximas eleições vou mesmo votar no PSOL!!!

Jonga Olivieri disse...

Fico feliz com isso, Joelma... Luciana Genro e o PSOL são a melhor opção para a esquerda no Brasil hoje.