domingo, 31 de janeiro de 2010

Vinhos à mesa

Tenho falado alguma coisa da culinária portuguesa. Acho que complementar uma boa refeição com um vinho adequado é uma forma de degustar qualquer prato. Os vinhos portugueses, além de serem reconhecidamente de boa qualidade, têm regiões demarcadas que vêm a ser um conjunto de áreas que produzem vinhos com características específicas, obtidos de uvas provenientes de castas colhidas naqueles locais. Apesar de serem produzidos em todo o país, as principais regiões demarcadas são as do Douro, do Dão, da Bairrada e dos Vinhos verdes. Vamos falar um pouco de cada uma delas.

O Douro produz o famoso vinho do Porto. Suas origens remontam a séculos de cultivo e fama, além de ser uma região belíssima em que os vinhedos são localizados em encostas às margens do rio do mesmo nome. Conheci bem esta área, pois, muito próxima à cidade do Porto, passei por ela inúmeras vezes em passeios ou até mesmo a trabalho. Aliás, viajar pelas estradas que acompanham o belo rio é uma experiência gratificante que recomendo a qualquer um que tenha a oportunidade de fazê-lo. O Douro foi a primeira região vinícola demarcada em Portugal.

O clássico vinho do Porto tinto é conhecido e tido como um dos melhores digestivos do mundo. Mas há também o branco, igualmente muito saboroso e que deve ser tomado como aperitivo, e que os portugueses até acompanham em refeições. São diversas as marcas deste precioso vinho. Porém o mais curioso é que as suas caves estão localizadas na cidade de Vila Nova de Gaia, que fica bem defronte à cidade do Porto, separada apenas pelo rio Douro, num trecho bastante estreito.

Os vinhos da região do Dão, são vinhos de mesa maduros bastante conhecidos no Brasil. O Dão é produzido na região que também é cortada pelo rio do mesmo nome, além de outro muito conhecido em Portugal de nome Mondego. É uma região bastante montanhosa, bem próxima à serra da Estrela. Suas marcas mais difundidas são Grão Vasco e Duque de Viseu, ou o Aliança Garrafeira Grão Tinto, mas eu recomendo o Reserva Dão Tinto. Um vinho inesquecível. São todos de primeira qualidade para acompanhar uma boa refeição.

Também assim são os vinhos da Bairrada, região bem próxima ao Porto, indo em direção a Coimbra e que é famosa pelo seu leitão, muito semelhante ao nosso à pururuca. Vinhos excelentes, cultivados em um delicioso clima temperado mediterrâneo, e que também são exportados para todo o mundo, tendo sua qualidade reconhecida em larga escala. Há um que conheço, o Angelus. Vale a pena provar. Não são tão difundidos no Brasil quanto os Dão, mas podem ser encontrados aqui com certa facilidade, em casas especializadas.

E o vinho verde? Este sim, um vinho autenticamente português. Uma verdadeira exclusividade daquele país. E, por sinal, delicioso. Deve ser servido com a garrafa em rápido movimento ascendente em relação ao cálice para que possa borbulhar e liberar alguns gases. É uma operação difícil, mas ao final de algum tempo de treino dá certo. É produzido no extremo norte de Portugal, no Minho, uma das áreas mais lindas e verdes de Portugal. O seu nome, deve-se ao fato de ser pouco maturado, tornando-se assim o oposto dos vinhos maduros. Mas, suas uvas excelentes propiciam um sabor e leveza fora de série. Os vinhos verdes são os meus preferidos. Pena que por aqui o mais famoso deles não é um dos melhores. O Casal Garcia é considerado por lá apenas razoável, sendo os mais apreciados o Quinta do Azevedo, o Gazela, o Quinta de Aveleda ou o Loureiro, somente para citar alguns. Na verdade, existe uma infinidade de outras boas marcas que podem ser encontradas no Brasil.

Isto feito, podemos sentar à mesa, fazer um bom brinde e saborear o melhor dos pratos...

domingo, 24 de janeiro de 2010

Javalís nas estradas

Neste domingo achei melhor falar de amenidades. Afinal, tambem fazem parte da vida da gente...

Sempre me refiro à culinária portuguesa como um ponto alto daquele país. A começar pelos pratos de frutos do mar. A Cataplana de Tamboril é alguma coisa inesquecível. Huuumm! E o Arroz de Mariscos? Sai da frente! Tem a Sapateira, também conhecida por Santola (1), um caranguejo enorme e que possui um sabor ímpar, além de uma quantidade de carne proporcional ao seu tamanho. Sem falar no bacalhau. Eles sabem preparar um peixe e servir moluscos com um delicioso acerto.
Mas os “enchidos” (embutidos) portugueses tambem são muito bons. Como a Morcela, a Alheira, o Chouriço de Vinho e uma infinidade de outros. Tem também os “estufados”, que na linguagem local veem a ser os nossos assados. E a caça! Por ser regulamentadíssima, tem épocas em que se pode caçar uma determinada espécie. É muito comum passar na estrada e ver um caçador com sua presa pendurada de um lado e uma espingarda do outro. Uma cena que pode parecer meio chocante, mas que está dentro da lei. Ou seja, acontece na ocasião em que a caça a um determinado tipo de animal está permitida.
Isso me faz lembrar um passeio que fizemos a Viseu, uma cidade linda e antiga na Região Central. Ali, nasceu aquele que é considerado o Asterix português. De nome Viriato, chefe de uma tribo lusitana que enfrentou e derrotou os romanos várias vezes em torno de 140 A.C. O herói tem um monumento ao lado de um dos terrenos onde foi travada uma importante batalha. Neste local, também existem ruínas de uma fortaleza romana da época. Na segunda noite em que lá estávamos, passando de carro por uma estrada ao voltar para o hotel, deparei com uma placa que dizia: “Há Javalí”. Parei no acostamento, não acreditando o que havia visto. Naquela época, era raro encontrar aquela carne no Brasil. Dei meia volta e parei na porta do restaurante, sendo que, pela primeira vez saboreei a dita iguaria com a mesma vontade e gula de um Obelix. Foi inigualável. A carne, grelhada e acompanhada de batatas, pimentões e cenouras era um primor.
Porém, a história mais interessante e um tanto quanto exdrúxula em relação aos javalís, ouvi de meu patrão português, que era um caçador inveterado. Caçava desde criancinha. E quando ia fazê-lo, na sua terra natal, em Trás-os-Montes, envergava sua indumentária de caçador, complementada por um chapéu adornado com uma pena lateral, quase igual àquele do Robin Hood. E lhe apetecia muito caçar javalís. Claro, é o ponto alto em matéria desse esporte. Uma ocasião, após uma frustrada incursão em que não resultou uma boa caça, passava pela estrada à noite, quando de repente, se lhe atravessou um javalí à frente. Não titubeou e lançou o seu Mercedes em cima do animal, quase conseguindo o seu intento. Sortudo, o javalí conseguiu escapar e embrenhar-se mata adentro. Afinal, um dia tem que ser o da caça...

(1) Santolas também são comuns na Irlanda e no Chile.

domingo, 17 de janeiro de 2010

De um domingo ao outro

Uma semana em que o assunto foi o Haiti. É como se todos, de repente, acordassem para a miséria existente naquele país. Mas o pior é que existe muito mais por aí... Por aqui. E passa tudo batido. O próprio Haiti dentro de pouco tempo volta ao seu habitual esquecimento. É só passar a onda de comoção geral ou aparecer outro fato que vire a notícia do dia na mídia.

Mídia que notoriamente está mais preocupada em divulgar e promover suas equipes e recursos (no caso das mais poderosas), para demonstrar a sua eficiência do que na própria notícia e suas causas. E que dão um cunho sentimentalista e piegas em excesso às referidas reportagens atrás da lágrima fácil de seus espectadores. Assim as informações se resumem a “furos” sensacionalistas e a informação fica em segundo plano.

Falar em imprensa, hoje completa 170 dias que o Estadão está censurado. E os Sarney, aproveitando este esquecimento “natural”, continuam fazendo deste país massa de manobra para os seus interesses pessoais e políticos. Se fossem somente eles.

Em Brasília, o Sr. da Silva mais uma vez saiu-se por cima do muro. Desta vez no tocante aos militares na questão dos direitos humanos. A coisa estava se encaminhando para uma abordagem séria e perigosa. Ao que parece, ele conseguiu jogar para escanteio o assunto ao afirmar que “não se tratava de uma caça às bruxas” (sic). Pelo menos por enquanto parece que agradou setores incomodados.

Na semana passada havia postado sobre baixas no Afeganistão. Pois bem, entrando ontem no site icasualties, as estadunidenses já subiram para 15 em apenas uma semana. Lembremo-nos que em 2001 foram 12 no total.

Voltando ao Haiti... Pouco ou nada se falou sobre o fato de naquela ilha Colombo ter desembarcado pela primeira vez na América. E que alguns anos depois toda a população nativa havia sido dizimada. Quase nada é citado sobre a história do país ou as causas de sua miséria extensiva. É como se a pobreza no Haiti fosse um fenômeno tão natural quanto o terremoto que o assolou.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Tragédia no cu do mundo

O pior não é o desastre. O pior mesmo é a miséria.
Quando assistimos o que se passa no Haiti, constatamos que, infelizmente, não podemos impedir as forças da natureza em suas manifestações. Mas o que dói, no fundo da gente é presenciar que o que acontece naquele país é consequência direta da pobreza extrema em que se encontra. Da total falta de recursos e possibilidades para se levantar e se reconstruir.
É a nação mais pobre da América. Seus índices de miséria absoluta se aproximam de alguns dos piores países africanos. Uma história amarga, banhada em sangue por ditaduras cruéis e difíceis de imaginar possíveis. Os Duvalier (Papa Doc e Baby Doc) foram recentes. E estão em nossa memória a repressão e o terror imposto por sua cruel polícia, os Tontons Macoutes, cuja tradução mais literal é bichos papões.
Mas, no passado este pobre país já passou por outros governos tão violentos quanto estes. De 20 governantes do século XIX a início do XX, dois terços foram assassinados ou depostos. Sofreu uma intervenção militar por parte dos EUA durante mais de 15 anos na primeira metade do século XX. Hoje é uma nação sem governo (mesmo antes da tragédia), que sofre uma intervenção estrangeira para manter partes beligerantes um pouco mais distantes de um conflito aberto.
Por acaso um terremoto de tais proporções atingiu este paupérrimo país. É o cumulo do absurdo e da infelicidade. Corpos se estendem pelos escombros. As operações de resgate são feitas à mão, sem equipamentos... Uma tarefa árdua e quase impossível. E enquanto isso, a imprensa burguesa apenas explora o sensacionalismo e o sentimentalismo barato e lacrimogêneo para depois relegar tudo ao que sempre foi, mantendo o status quo vingente.
Daí, repito, o pior não é o desastre. O pior mesmo é a miséria. No cu do mundo.

domingo, 10 de janeiro de 2010

Números revelados

Escrevi neste blogue em 25 de novembro de 2009 com o título de “Números velados” sobre a dificuldade em aferir as baixas estadunidenses no Afeganistão. Há um site (icasulaties.org) que mantem esses dados atualizados. Aliás, não somente as perdas ianques, como as inglesas e de outras tropas da chamada coalizão que lá operam, incluindo as da OTAN. Os números ianques chegam a 953 desde 2001 (1).
Bem menos do que os 4.372 (2) no Iraque (onde o confronto foi sempre mais aberto), porém numa grande progressão que demonstra que à medida que se intensifica a luta, mais se expõem e em decorrência disto mais vulneráveis se tornam.
De 12 em 2001, pulou para 49 em 2002 e manteve a média em 2003 com 48. Em 2004, registrou 52 e em 2005 foi para 99. Em 2006 ficou em 98. 117 em 2007 e 155 em 2008 prepararam o salto para os 319 no ano passado. Mais do dobro do anterior. Somente em outubro tombaram 24 soldados. O ano de 2010 inicia seus primeiros dias com quatro.
Se a tendência no Iraque foi de diminuir a cada ano, notamos que no Afeganistão tem sido o inverso, aumentando sem parar. O reforço enviado por Obama, na sua implacável caça a Osama, deverá intensificar a luta tornando-a mais aberta. E quanto mais aberta, mais difícil será uma regressão. A quantidade de atentados tem aumentado no país ocupado e o corrupto governo local não colabora para uma “melhora” do quadro.
O império defronta-se com uma sinuca de bico.

(1) 1574 no total geral.
(2) No Iraque os números são de 2003 para cá.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Pensata para o primeiro domingo do ano

Olhando ao redor, verificamos como vivemos de convenções. Comecemos pela própria passagem de ano. Tem gente para as quais a questão da cor da roupa com que vai entrar na transição de um ano para outro é fundamental. Mas, pelo menos para nós que vivemos no sudeste, não é uma real passagem de ano, pois ocorre uma hora antes, motivada pelo horário de verão. Tudo e apenas uma convenção.
Aliás, este período de final de ano e suas “festas” é assim. Não condeno os cristãos que comemora(va)m a vinda de seu messias, mas é ridícula a forma na qual a festa se transformou, um evento “pagão” de trocas de presentes é no que se resume o natal nestes tempos em que passamos. Será uma convenção céltica? Ou de romanos na antiguidade?

Tem apenas algumas semanas que li sobre a opinião de alguns especialistas a garantir que o tal novo traçado da linha 2 do metrô do Rio ia ser caótico por uma simples razão: não aumentaram a quantidade de novos vagões, impossibilitando que o intervalo entre composições continuassem (pelo menos) nos atuais quatro minutos. Além disso, afirmavam que esses novos trens só chegarão em 2011.
E eles tinham toda razão. Pelo menos no primeiro dia da operação o transporte tornou-se um caos, e teve gente que atrasou mais de três horas o seu percurso habitual. Depois não obtive mais informações. Curiosamente a mídia calou-se sobre a questão. Eu andei um dia na linha 1 e estava tudo aparentemente bem porque foi no dia 30, véspera de um feriado em que o movimento era pequeno.

Foi um imensurável prazer rever “La Dolce Vita” de Fellini, realizado em 1960. Quer dizer, praticamente 50 anos atrás.
À sua época foi polêmico ao abordar questões que o tempo até superou, mas é importante levar-se em consideração o contexto “moral” daquele período.
Devemos nos lembrar que setores mais reacionários da igreja romana e da sociedade italiana “cairam de pau” no trabalho do diretor. Dois anos depois, Fellini realizou em “Boccaccio 70” um excelente episódio “As tentações do dr. Antônio”, no qual aborda o falso moralismo com uma maestria digna de sua genialidade.
Temos mesmo que tirar o chapéu para o saudoso Federico Fellini e sua obra.