quinta-feira, 9 de maio de 2013

Francisco Fernández Buey, um marxista que amava Gramsci e Simone Weil





Salvador López Arnal
Traduzido para Novas Pensatas por Jorge Vital de Brito Moreira

Discípulo de Manuel Sacristán Luzón (1), destacado lutador anti franquista, comunista democrático com arestas libertárias, reconhecido estudioso da obra de Bartolomé de Las Casas, Francisco Fernández Buey [FFB], nasceu em Palencia, em 1943.  
Entre 1952 e 1960, ele estudou o colegial no Instituto Jorge Manrique em sua cidade natal. Lá ele conheceu dois professores que o marcaram profundamente: José Rodriguez Martinez e Xesús Alonso Montero.   
Entre 1961 e 1966, estudou Filosofia na Universidade de Barcelona. Foi então que ele conheceu Manuel Sacristán e tornou-se um líder admirado do movimento estudantil democrático. As duas primeiras manifestações que ele participou resume praticamente os eixos essenciais da sua trajetória política: a primeira, em 1962, foi em solidariedade com a luta dos mineiros asturianos;  a segunda, um ano mais tarde, para protestar contra o assassinato do líder comunista Julian Grimau pela ditadura do General Franco.
Nesse mesmo ano, iniciou sua militância na organização universitária do PSUC (Partido do Socialismo Unificado de Cataluña) e entre 1965 e 1966, contribuiu para a criação do Sindicato Democrático dos Estudantes da Universidade de Barcelona (SDEUB). Francisco F. Buey foi delegado  do sindicato clandestino e ajudou a organizar  “La Capuchinada” (2) uma decisiva reclusão dos estudantes que foram duramente reprimidos pela policia barcelonesa do regime franquista.
Francisco Buey foi preso três vezes em 1966, tendo estado várias semanas na “Prisão Modelo” de Barcelona.  O franquismo abriu  contra ele um processo disciplinar por três anos, sob a reitoria do farmacologista fascista Garcia Valdecasas; Francisco Buey foi despojado da bolsa de estudo com a qual tinha podido estudar desde o colegial , e foi obrigado a fazer o serviço militar no deserto do Saara, então colônia espanhola. Na África, incapaz de voltar ao continente, permaneceu de janeiro de 1967 a maio de 1968. 
Após seu retorno, em agosto de 1968, casou-se civilmente com a historiadora Neus Porta com quem teve um filho, o professor, ensaísta e escritor Eloy Fernández de Porta. FFB foi novamente preso em 11 de setembro de 1968, acusado de soltar pombas com bandeiras vermelhas de quatro barras (a bandeira não independentista da Catalunha).
FFB andou foragido a maior parte do ano de 1969 pelo estado de emergência introduzido pelo regime de Franco e sob a acusação de ter organizado - com Manuel Sacristán e outros companheiros -  a comissão de treinamento do PSUC. Salvou-se da  prisão graças à habilidade do advogado Josep Solé Barbera, outro lutador  memorável contra a ditadura de Franco. Durante esse ano e o seguinte, FFB ganhava a vida traduzindo (principalmente do francês e do italiano para o espanhol) para as editoras Ariel, Península, Fate e Grijalbo. Em 1970, ele ajudou a organizar a reclusão dos intelectuais catalães no Mosteiro de Montserrat em reação ao Conselho de Guerra  contra um grupo de revolucionários vascos.
Durante 1971-72 pode terminar o curso de Filosofia e Letras com Prêmio Especial da Licenciatura. Em 1973, começou a ensinar no Departamento de História da Filosofia da Universidade de Barcelona como assistente do professor Emilio Lledo.
Durante o período 1974-1975, colaborou na organização do movimento PNNS, foi membro da sua Coordenadoria Estadual, e ajudou a organizar uma das maiores greves de ensino sob o franquismo. Como resultado, ele foi expulso novamente da universidade, depois de ter sido readmitido pouco depois da morte do general criminoso Francisco Franco que morreu em novembro de 1975. 
Em 1976, ele passou a trabalhar na Faculdade de Economia da Universidade de Barcelona como assistente de Manuel Sacristán. Simultaneamente, lecionava na Escola de Sociologia da Província de Barcelona e foi quando ele começou a escrever seus primeiros ensaios- “Escritos sobre Gramsci” e “Conhecer a obra de Lenin”, sem abandonar seu compromisso poliético, colaborando na fundação das Comissões de Ensino dos Trabalhadores.
Em 1977, com Manuel Sacristán, Jacobo Muñoz, Rafael Argullol e outros companheiros, fundou a revista Materiales e começou a trabalhar na revista El Viejo Topo. Nesse mesmo ano, ele descobriu a ecologia social e juntou-se à Comissão Antinuclear de Catalunha (CANC), ajudando a convocar os primeiros manifestações ecologistas e antinucleares em Barcelona. Em 1979, também com Manuel Sacristán e outros colegas, fundou a revista Mientras tanto.
Entre 1980 e 1982, FFB terminou de escrever sua tese de doutorado, dirigido por José María Valverde sobre o marxismo italiano dos anos sessenta (Contribuição Crítica do marxismo cientificista), ligando-se ao Instituto Gramsci de Roma, através do filosofo amigo Valentino Gerratana.
Entre 1983 e 1989, dirigiu uma cátedra interina na Universidade de Valladolid e viveu lá, na cidade de Leon, durante seis anos. Nesse período, e em suas próprias palavras: "1) Transformei-me em pacifista e entrei nos Comitês Anti-OTAN, 2);  Fundei um Centro para o Estudo dos Problemas da Paz e Desarmamento, vinculado à UNESCO; 3) Tornei-me um dos primeiros objectores fiscais dos gastos militares e trabalhei em favor da objeção de consciência; 4) Participei em várias conferencias gramscianas onde conheci e me relacionei com a família de António Gramsci”.  
Em 1990, ele retornou a Barcelona e ocupou a cátedra de Metodologia das Ciências Sociais (que tinha sido ocupada anteriormente por Manuel Sacristán), da Faculdade de Economia da UB. Ele continuou escrevendo, principalmente sobre os movimentos sociais alternativos para a revista Mientras tanto e trabalhou com seu amigo e companheiro Octavi Pellissa no Centro de Emprego e Documentação (CTD) de Barcelona.
Em 1993, ele estava ensinando ("e aprendendo"), em El Salvador e Equador, com uma ONG de professores solidários da Catalunha. Foi quando lhe ofereceram um cargo de professor de Ética e Filosofia Política da nova Faculdade de Ciências Humanas da UPF (Universidade Pompeu Fabregas), faculdade, onde permaneceu até o fim de seus dias. Na UPF, também foi diretor de uma cátedra da UNESCO para o estudo das relações interculturais. A partir de 1998, dirigiu - junto com o poeta, professor e ecosocialista Jorge Riechmann - uma importante coleção dos "Clássicos do pensamento crítico" para a editora “Los Libros de la Catarata”.
Desde 1975, FFB trabalhou academicamente diversos temas: história da filosofia, filosofia da ciência, filosofia das ciências sociais, história das ideias, história da ciência e, destacadamente, em ética e filosofia política. Foi membro de instituições acadêmicas como a Internacional Gramsci Society e a New York Academy of Sciences.
FFB publicou em vida uns quinze livros e inúmeros prefácios, ensaios e artigos, alguns deles traduzidos para línguas como o francês, italiano, inglês, alemão, português, polonês, russo e chinês. Entre esses ensaios caberia destacar: Discursos para insubmisos discretos [Escritos: 1976-1992], 1993; La gran perturbación. Discurso del indio metropolitano, 1995; Ni tribunos. Ideas y materiales para un programa ecosocialista, 1996 [em colaboração con Jorge Riechmann]; Marx (sin ismos), 1998 (2ª edición corregida, 1999); Leyendo a Gramsci, 2001;  Poliética, 2003; Guía  para una globalización alternativa. Otro mundo es posible, 2004; Albert Einstein. Ciencia y conciencia, 2005; Utopías e ilusiones naturales, 2007; Por una universidad democrática., 2009. A editora El Viejo Topo está prestes a publicar um livro póstumo: Humanismo y tercera cultura.
Ao internacionalista ecopacifista Francisco Fernández Buey, falecido prematuramente em agosto de 2012, um ano após a morte de sua esposa e parceira Neus Porta, o turismo lhe parecia a praga da sociedade pós-moderna.

Notas do Tradutor:
  
1)  Manuel Sacristán Luzón (Madrid, 1925-Barcelona, 1985), filósofo, lógico, professor, tradutor e escritor é considerado o maior filosofo marxista espanhol do seculo XX.  O professor e escritor Salvador Lopez-Arnal, já foi apresentado aos leitores de Novas Pensatas, através do artigo “Manuel Sacristán, o compromisso do filósofo”,  publicado por este blogue em  8 de março de 2011.
  
2) “La Capuchinada” foi o nome que recebeu a reclusão dos estudantes no  convento de capuchinhos de Sarriá de em 1966, y que devido a sua repercussão na mídia passou a ser conhecido pela  imprensa da época como "La Capuchinada".

Um comentário:

Misael disse...

Excelente esta postagem do professor Jorge Moreira em que ele nos apresente um pensador marxista, para mim, até então desconhecido.