sábado, 13 de outubro de 2012

Um sábado, um poema




José Umberto Dias (na foto, à esquerda, com Tuna Espinheira e Jorge Alfredo) foi o diretor de “Perâmbulo”, um curta do qual participei em Salvador, Bahia (1966/7) e concorreu ao “Festival JB”, no cinema Paissandu, de saudosa memória. E, para alem disso dirigiu dois longas: "O Anjo Negro" (1973) e "Revoada" (em pós-produção), enviou-me hoje este poema belíssimo de Hilda Hilst (1):

O tempo é na verdade o do retorno.
Pensa como se agora fôssemos argila
E estivéssemos sós e mudos, lado a lado.
Por um momento (se viessem chuvas)
Talvez se misturasse o meu corpo com o teu
E um gosto de terra úmida aproximasse

Brandamente
As nossas bocas.

Que seja assim lembrada a tua ausência:
Como se nunca tivéssemos nascido
Sangue e nervos. Como se nunca tivéssemos
Conhecido a verdade e a beleza do amor.
Pensa como seria se não fôssemos.
E não houvesse o pranto, o ódio, o desencontro.
O tempo é na verdade o do retorno.
Se não for amanhã, será um dia.
O céu azul e limpo, o mar tranquilo
Pássaros e peixes, pássaros e peixes

1. Hilda Hilst (1930/2004) Foi uma poeta, ficcionista, cronista e dramaturga brasileira, e é considerada pela crítica especializada como um dos maiores escritores em língua portuguesa do século XX. 


5 comentários:

Joelma disse...

Que beleza!! Santa ignorância, mas eu não a conhecia.
Vou procurar saber mais dela. Juro que vou!

Mário disse...

Maravilha. Hilda Hilst era de grande sensibilidade.

Como por exemplo:

"Colada à tua boca a minha desordem. O meu vasto querer. O incompossível se fazendo ordem. Colada à tua boca, mas descomedida Árdua Construtor de ilusões examino-te sôfrega Como se fosses morrer colado à minha boca. Como se fosse nascer E tu fosses o dia magnânimo Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer."

André Setaro disse...

Vale lembrar que, neste já no ocaso 2012, ''Perâmbulo'' faz exatos 45 anos, indo célere, e fagueiro, para o seu meio-século. Como o tempo voa! É a angústia heiddergeniana de 'estar no mundo'. Mas Dona Emerenciana continua na sua máquina de costura.

Misael de Silva Costa disse...

'O Anjo Negro' é da mesma safra de 'Meteorango Kid' de André Luiz Oliveira.
Mas o sergipano que formou-se na UFBa em Ciências Sociais realizou tambem 'Monte Santo - O Caminho da Santa Cruz', 'Salvador em Película - Um Século de Memória', 'Memória em Película - A Bahia e o Estado Novo', e outros curta-metragens.
É crítico de cinema, ator, roteirista, dramaturgo e poeta.
Publicou tambem um livro retrospectivo sobre a obra de Walter da Silveira, um importante crítico de cinema baiano.

Anônimo disse...

Gostei demais deste José Umberto Dias. Parabens por conhecê-lo!

L.P.