sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

O “caso” do homem Minister


Antes de iniciar este “causo”, quero contar que nunca, em toda a minha vida, trabalhei em outra atividade que não fosse publicidade. Conheço casos de colegas ou amigos, que, ou por força das necessidades ou por outros motivos foi artista plástico, jornalista ou até vendedor em lojas ou magazines. Havia um diretor de arte português que iniciou sua carreira em publicidade com mais de 40, e faturou dezenas de prêmios por suas criações.

Um dado curioso é que grande parte dos publicitários nas décadas de 1970/80 eram de esquerda, consequência dos “anos de chumbo” da ditadura militar que, em geral oferecia empregos nas áreas de ciências “exatas”, menosprezando as “humanas”, não somente devido à visão tecnocrata para a execução das obras faraônicas cuja finalidade era impressionar a pequena burguesia (hoje chamada de classe média), maravilhada com o “milagre econômico” brasileiro, como também para gerar lucros para as multinacionais que financiaram o golpe de 1º de abril de 1964.

Mas... que tal irmos ao caso:?
 
Quando atendia a conta da Souza Cruz na Salles, lá pros idos dos anos 1980, executávamos jobs para diversas das suas marcas. O Eric Nice era o designer exclusivo de todas as embalagens do fabricante. Nos seus mais de setenta anos, aquele mestre, em sua salinha na Salles/São Paulo elaborava meticulosamente mockups de novas caras para produtos antigos, ou caras inéditas para produtos idem. Era o bam-bam-bam da história. E, tiro o meu chapéu para reverenciar o seu trabalho e a sua memória.

Mas, voltando à vaca fria. À Salles Rio, que na época atendia produtos da Souza Cruz e Brahma, além claro de outras contas como a Sul América Seguros, a Texaco ou o Banco do Brasil, o DNER e a Embratur, isso somente para enumerar algumas das mais expressivas. Ali, fizemos bons trabalhos para diversas marcas da Souza Cruz. Lembro-me de um filme para os cigarros Continental usando aquela música “Eu voltei... porque aqui é o meu lugar... e lá, lá, lá... lá, lá, lá...”, que emocionou o Brasil e decerto marcou presença na história da publicidade neste país.

Mas a Souza Cruz também tinha as suas pedrinhas no sapato. E uma delas era uma marca pioneira em cigarros com filtro, outrora um símbolo de status, e que de repente começava a despencar vertiginosamente em vendas. Lembro-me perfeitamente da primeira reunião que tivemos com o Domingos Logullo (à época o Diretor Nacional de Criação da agência) em que ele falava da necessidade que teríamos de criar uma campanha, para alavancar e reerguer a marca, pois o fabricante não queria desativá-la. Paulistamente falando, uma dupla de criação de Sampa vinha nos “ajudar”. E veio. Prefiro nem citar nomes, pois eram sujeitos do cacête com quem nos demos otimamente, apesar dos sentidos paternal e intervencionista intrínsecos...

O certo é que de imediato começamos a fazer reuniões atrás de reuniões. Longos brainstorms a portas fechadas para achar uma solução. Foram dias, semanas de um esforço em que saíram as ideias mais estaparfúdias e as mais criativas quase que simultaneamente. Um exercício criativo de causar inveja a qualquer Jerry Della Femina¹ da vida.

Mas a coisa alongou-se por este período sem uma solução aparente. Examinando números e o mercado, suas novidades como produtos light e otras cositas más, ficava difícil reerguer a agora condenada e outrora gloriosa marca. Mas, um belo dia, alguém que não me lembro mais do nome, saiu com a ideia do “Homem Minister”. Um fator novo que balançou o coreto. Mas, quem seria este homem? Quais as características que fariam alguém ser o homem Minister?

Depois de muitos vais e vens, de se terem rifado “ene” alternativas, chegamos finalmente a um nome: Tarcísio Meira. Bonitão, ator de novela, comprovadamente “macho”, casado há anos com a Glória Menezes. Por quê não? E ficamos nele. Por unanimidade a agência inteira aplaudiu. Até que um “advogado do diabo”, que também não me lembro o nome, mas que se morreu, com absoluta certeza deve estar ardendo nas profundezas do inferno, levantou aquela lebre: “Mas, e se o cara morre? Afinal ele pode ter um acidente, vive na ponte aérea e blá, blá, blá...”

Assim morreu o “Homem Minister”. E algum tempo depois, a própria marca. Quanto ao Tarcísio Meira, acho que a última vez que foi visto estava vivinho da silva, fazendo um papel em alguma nova novela da vida... Duro na queda, sô!

1. Jerry, considerado nos anos 1960/70 dos mais criativos publicitários da época, foi um dos sócios da “Della Femina Travisano & Partners”, também uma das agências mais criativas dos Estados Unidos, e tinha uma característica ‘sui generis’ em sua forma de atuar, chegando uma ocasião a afirmar que sua agência não aprovaria nada com seus clientes. Estes veriam os anúncios publicados, os filmes no ar, etc. Porque ele acreditava que, por saber o que fazia, o cliente tinha que confiar nele e em sua equipe. E...  fim de papo!

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Um comentário:

Joelma disse...

Eu cheguei a visitar o seu Casos da Propaganda e li esta sua publicação naquele blog. A propósito, você não tem publicado mais nada lá. Por que?
É um caso engraçado, mas têm outros até melhores. Sugiro que publique aqui em Novas Pensatas algumas dessas historinhas hilariantes.
A propósito, por acaso sabes se o "advogado do diabo" ainda está entre nós? Porque o Tarcísio ainda continua firme e forte, apesar de estar beirando ou já passou dos 90. São "coisas do futebol"!
E por falar em estar entre nós, o Tavim simplesmente desapareceu. Sim, porque, coincidência ou não, ele é (ou foi) o "advogado do diabo" das Novas Pensatas. Ou não, Jonga "Tarcísio" Olivieri?