Diálogo acidental sobre o povo brasileiro,
estadunidense e outros semelhantes.
Conto
de Jorge Vital de Brito Moreira
Numa cafeteria da Gringolândia, Romeu de Oliveira e Egroj
Russell, amigos de velhos tempos, sentam-se para tomar café e bater um papo. Egroj pergunta:
-E aí meu jovem? Tudo bem? Como vai você, a família? Quais
são as novidades Romeu?”
- Pra mim, ultimamente, tudo tem sido uma merda! Estou
cansado e me sinto velho. Já não tenho energia pra quase nada. Falta energia pra
escrever, pra ler, pra terminar um bom livro. Falta energia até pra tocar
violão, piano ou falar com os amigos pelo telefone”.
-
Não se preocupe. É apenas uma fase, Romeu, logo passará. Essa conversa me
lembra daquela música... Egroj começa a cantarolar uma
musica cubana em portunhol: “El tiempo
passa, nos vamos poniendo viejo, el amor no lo reflejo como ayer”...
Romeu continua: - Estou gordo, lento, pesado e preguiçoso. Será
que não gosto mais de mim, do que sou ou do que represento? Talvez tudo isso
passará quando o inverno terminar. Tomara!
Egroje lembra e
cantarola a melodia do filme Casablanca
“As time goes bye”...
Romeu prossegue no mesmo tom: -Não me recordo de ter
suportado um inverno tão longo, tão
tedioso e tão chato aqui na Gringolândia. Chego ao ponto de começar a sentir náuseas de viver neste frio durante
tanto tempo por estas bandas.
Egroje consola musicalmente o amigo,
lembrando de uma melodia brasileira da geração deles: “Green grass, blue eyes, gray sky, god bless, silent pain and happiness.
I come here to say yes and I say...”
Depois do intervalo musical, Romeu persiste: - Acho que já
não tenho saco pra aguentar tanta solidão ou aguentar a indiferença das pessoas
daqui. E o pior de tudo é que também começo a sentir a indiferença da minha
filha e às vezes da minha mulher também...
Egroje interrompe e diz ao amigo: - Sei ao que você está se
referindo, Romeu. A solidão é um grande problema pra pessoas que vivem neste
país, sobretudo pra pessoas imigrantes, velhas e sensíveis como você e eu. Por
aqui, os indivíduos, pra não se sentirem solitários, resolvem, pra fazer amigos
ou conhecer pessoas, frequentar as igrejas locais, participar de grupo religioso ou praticar uma
religião qualquer.
Romeu toma um gole do café quente, olha pro amigo e
pergunta: -Mesmo que elas não acreditem
em Deus, em santo ou milagre?
Egroje responde: - Mesmo sem ser católico, protestante,
fundamentalista ou crente de qualquer religião, o que importa para esses
indivíduos é estar perto de outras pessoas, estar juntos delas, estar compartindo um lugar onde possam se reunir e
socializar, ao menos, uma vez cada semana. Naturalmente que existem outros
tipos de indivíduos que procuram se socializar compartilhando com diversas atividades
como fazer esportes, andar de bicicleta, correr, frequentar clubes de dança, de
leitura, de livros, ou de arte com outras pessoas. Mas acredito que a maioria
das pessoas ainda procuram a religião e a fé como forma de socialização.
- É incrível o nível de fragmentação, solidão e alienação a
que chegamos!
Egroje fez uma pausa, bebeu um pouco do café e logo
suspeitou: - Não me diga que você já está pensando voltar pro Brasil?
- Tenho pensado em voltar pro Brasil mas, por agora, tenho
mudado de ideia. O Brasil, humanamente, está quase uma merda. Está cada vez
mais parecido com os EUA: é o mesmo materialismo, o mesmo individualismo, a mesma
alienação, a mesma corrupção, e a mesma guerra entre as classes sociais. A
única coisa que lhes importa, neste sistema, é ganhar dinheiro.
- Você tem razão: atualmente, não existe nenhum outro valor
(seja moral, afetivo, intelectual ou espiritual) que tenha tanta importância para a maioria dos
nossos brasileiros: O negócio é dinheiro, dinheiro e dinheiro. Só falta que o
governo Temer imprima no dinheiro brasileiro o que está impresso no dólar
americano: “In God we trust”.
- E o pior é que, politicamente, o golpe de estado imposto
por canalhas e bandidos como Michel
Temer, Eduardo Cunha, José Serra, Aécio Neves, Fernando Henrique Cardoso, Gilberto Mendes e o Sergio Moro não ajuda a mudar nada no Brasil e colocou o
país na trilha da regressão politica, da crise econômica e do colapso social.
Essa volta, em 2016, ao golpe militar de 1964, me tirou toda a tesão de voltar
pro Brasil.
Egroje continua: - Sobre a nossa a alienação ideológica, é
doloroso observar a atual vontade dos brasileiros de perder sua identidade cultural
para ficar cada vez mais parecido aos estadunidenses. Outro dia um amigo
brasileiro me contou uma piada muito engraçada procurando ilustrar um aspecto da ignorância e alienação de
grande parte dos brasileiros em relação à
realidade histórica que estamos vivendo. Só que eu acho que a piada se aplicaria
não somente ao comportamento da maioria do povo brasileiro mas se aplicaria
também ao comportamento do povo estadunidense, do povo europeu, do povo latinoamericano
e ao de outros povos.
- Quero escutar a piada. Conte:
Um individuo chegou no consultório de um oftalmologista
carregando uma grande lata de leite em pó. A secretaria do medico o atendeu
perguntando-lhe o que era que se passava com seus olhos.
O individuo não disse uma palavra. Apenas abriu a tampa da
lata para que a secretaria tivesse a oportunidade de ver com seus próprios
olhos o tamanho do problema visual que o trazia aquele consultório.
A secretária assustada disse: - Ave Maria! O que é isso?
Meu senhor, lamento muito, mas o doutor oculista não pode resolver este tipo de
problema. O senhor deveria procurar um gastroenterologista, um medico
especialistas em problemas intestinais.
O individuo surpreso, com a voz alta e indignada disse: - Moça, não me venha com lenga lenga.
Você não sabe nada. Eu sei perfeitamente que a solução pro meu problema dos
olhos se resolve aqui com o doutor dos óculos. Quero falar agora mesmo com ele.
Nesse momento, o médico oculista, escutando a voz indignada do individuo, saiu do
consultório para saber o que acontecia na sala de espera
Quando o paciente viu o Doutor aproximando-se, abriu a lata
de leite em pó e mostrou o material que trazia: Veja doutor o tamanho do meu
problema.
O doutor delicadamente disse: - Meu amigo, sinto lhe dizer
que a minha secretária tem toda a razão. O seu problema tem de ser resolvido
com um especialista em problemas intestinais.
- Não doutor, estou seguro que o senhor está enganado. Meu
problema tem que ser resolvido aqui.
O doutor, observou o individuo cuidadosamente e logo disse:-
Okay meu amigo. Eu admito que eu
posso estar enganado. Mas eu só
solucionarei o seu problema se você me explicar qual é a relação cientifica
entre os seus olhos e esta grande merda que você traz nesta lata de leite.
O individuo meio abobalhado respondeu: - Doutor, este é o xis
do problema pois cada vez que eu vou no sanitário defecar esta grande obra, eu choro,
Doutor... Eu choro muito.
Depois de escutá-la Romeu se manifesta: - A piada é
engraçada e alegoriza uma parte importante da ignorância e da alienação
nacional popular. Mas, como podemos observar, ainda que seja uma piada estereotipada
sobre o povo brasileiro, o individuo representado na piada é um sujeito
potencialmente inteligente, um sujeito capaz de pensar e fazer relações logicas
entre objetos e acontecimentos. O que falta a este individuo é educação
adequada e informação fundamentada racional e/ou cientificamente relevante. Este individuo (nacional ou internacional)
necessita parar de falar e atuar com base na percepção imediata dos seus
sentidos e da suposta verdade do dogma religioso de evangelistas de todo tipo.
Egroje responde: - Concordo com você. Faz uma pausa, olha o
relógio e fala: Tenho que ir mas para concluir esta conversa neste momento,
gostaria de repetir o que disse antes: Mesmo estereotipada, esta piada
ilustraria relativamente, não somente o
comportamento da maioria do povo
brasileiro mas se aplicaria também ao comportamento da maioria do povo
estadunidense, do povo europeu, do povo latinoamericano bem como a todos os
povos explorados economicamente, dominados politicamente, e colonizados culturalmente
pela classes dominantes nacionais e internacionais.
Romeu finaliza: - Como trataram de nos ensinar Darcy Ribeiro e Paulo Freire, dois dos mais
brilhantes educadores brasileiros da história do Brasil, não é o povo
brasileiro que deve ser responsabilizado por ter estado vivendo durante séculos
subjugado pela exploração econômica, pela dominação politica, pela ignorância e
pela alienação humana. Os representantes da classe dominante do capitalismo neoliberal
são os atuais e únicos responsáveis pela injustiça social, pela degradação
humana e pela infame ignorância a que submetem o povo do nosso país.
-Bom Romeu, tenho
que ir agora. Continuaremos a conversa num outro dia. Bye, Bye, homem. See you later, aligator.
- After awhile crocodile.
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