domingo, 26 de março de 2017

Pensatas de Domingo




Diálogo acidental sobre o povo brasileiro, estadunidense e outros semelhantes.

Conto de Jorge Vital de Brito Moreira

Numa cafeteria da Gringolândia, Romeu de Oliveira e Egroj Russell, amigos de velhos tempos, sentam-se para tomar café e  bater um papo. Egroj  pergunta:
-E aí meu jovem? Tudo bem? Como vai você, a família? Quais são as  novidades Romeu?”
- Pra mim, ultimamente, tudo tem sido uma merda! Estou cansado e me sinto velho. Já não tenho energia pra quase nada. Falta energia pra escrever, pra ler, pra terminar um bom livro. Falta energia até pra tocar violão, piano ou falar com os amigos pelo telefone”.
            - Não se preocupe. É apenas uma fase, Romeu, logo passará. Essa conversa me lembra daquela música... Egroj começa a cantarolar uma musica cubana em portunhol: “El tiempo passa, nos vamos poniendo viejo, el amor no lo reflejo como ayer”...
Romeu continua: - Estou gordo, lento, pesado e preguiçoso. Será que não gosto mais de mim, do que sou ou do que represento? Talvez tudo isso passará quando o inverno terminar. Tomara!
Egroje  lembra e cantarola a melodia do filme CasablancaAs time goes bye”...
Romeu prossegue no mesmo tom: -Não me recordo de ter suportado um inverno tão longo,  tão tedioso e tão chato aqui na Gringolândia. Chego ao ponto de começar a  sentir náuseas de viver neste frio durante tanto tempo por estas bandas.
            Egroje consola musicalmente o amigo, lembrando de uma melodia brasileira da  geração deles: “Green grass, blue eyes, gray sky, god bless, silent pain and happiness. I come here to say yes and I say...”
Depois do intervalo musical, Romeu persiste: - Acho que já não tenho saco pra aguentar tanta solidão ou aguentar a indiferença das pessoas daqui. E o pior de tudo é que também começo a sentir a indiferença da minha filha e às vezes da minha mulher também...
Egroje interrompe e diz ao amigo: - Sei ao que você está se referindo, Romeu. A solidão é um grande problema pra pessoas que vivem neste país, sobretudo pra pessoas imigrantes, velhas e sensíveis como você e eu. Por aqui, os indivíduos, pra não se sentirem solitários, resolvem, pra fazer amigos ou conhecer pessoas, frequentar as igrejas locais,  participar de grupo religioso ou praticar uma religião qualquer.
Romeu toma um gole do café quente, olha pro amigo e pergunta: -Mesmo que  elas não acreditem em Deus, em santo ou milagre?
Egroje responde: - Mesmo sem ser católico, protestante, fundamentalista ou crente de qualquer religião, o que importa para esses indivíduos é estar perto de outras pessoas, estar juntos delas, estar  compartindo um lugar onde possam se reunir e socializar, ao menos, uma vez cada semana. Naturalmente que existem outros tipos de indivíduos que procuram se socializar compartilhando com diversas atividades como fazer esportes, andar de bicicleta, correr, frequentar clubes de dança, de leitura, de livros, ou de arte com outras pessoas. Mas acredito que a maioria das pessoas ainda procuram a religião e a fé como forma de socialização.
- É incrível o nível de fragmentação, solidão e alienação a que chegamos!
Egroje fez uma pausa, bebeu um pouco do café e logo suspeitou: - Não me diga que você já está pensando voltar pro Brasil?
- Tenho pensado em voltar pro Brasil mas, por agora, tenho mudado de ideia. O Brasil, humanamente, está quase uma merda. Está cada vez mais parecido com os EUA: é o mesmo materialismo, o mesmo individualismo, a mesma alienação, a mesma corrupção, e a mesma guerra entre as classes sociais. A única coisa que lhes importa, neste sistema, é ganhar dinheiro.
- Você tem razão: atualmente, não existe nenhum outro valor (seja moral, afetivo, intelectual ou espiritual)  que tenha tanta importância para a maioria dos nossos brasileiros: O negócio é dinheiro, dinheiro e dinheiro. Só falta que o governo Temer imprima no dinheiro brasileiro o que está impresso no dólar americano: “In God we trust”.
- E o pior é que, politicamente, o golpe de estado imposto por canalhas e bandidos como  Michel Temer,  Eduardo Cunha, José Serra,  Aécio Neves,  Fernando Henrique Cardoso,  Gilberto Mendes e o Sergio Moro  não ajuda a mudar nada no Brasil e colocou o país na trilha da regressão politica, da crise econômica e do colapso social. Essa volta, em 2016, ao golpe militar de 1964, me tirou toda a tesão de voltar pro Brasil.
Egroje continua: - Sobre a nossa a alienação ideológica, é doloroso observar a atual vontade dos brasileiros de perder sua identidade cultural para  ficar cada vez mais parecido  aos estadunidenses. Outro dia um amigo brasileiro me contou  uma  piada muito engraçada procurando ilustrar  um aspecto da ignorância e alienação de grande parte dos  brasileiros em relação à realidade histórica que estamos vivendo. Só que eu acho que a piada se aplicaria não somente ao comportamento da maioria do povo brasileiro mas se aplicaria também ao comportamento do povo estadunidense, do povo europeu, do povo latinoamericano e ao de outros povos.
- Quero escutar a piada. Conte:
Um individuo chegou no consultório de um oftalmologista carregando uma grande lata de leite em pó. A secretaria do medico o atendeu perguntando-lhe o que era que se passava com seus olhos.
O individuo não disse uma palavra. Apenas abriu a tampa da lata para que a secretaria tivesse a oportunidade de ver com seus próprios olhos o tamanho do problema visual que o trazia aquele consultório.
A secretária assustada disse: - Ave Maria! O que é isso? Meu senhor, lamento muito, mas o doutor oculista não pode resolver este tipo de problema. O senhor deveria procurar um gastroenterologista, um medico especialistas em problemas intestinais.
O individuo surpreso, com a voz alta e indignada  disse: - Moça, não me venha com lenga lenga. Você não sabe nada. Eu sei perfeitamente que a solução pro meu problema dos olhos se resolve aqui com o doutor dos óculos. Quero falar agora mesmo com ele.
Nesse momento, o médico oculista, escutando  a voz indignada do individuo, saiu do consultório para saber o que acontecia na sala de espera
Quando o paciente viu o Doutor aproximando-se, abriu a lata de leite em pó e mostrou o material que trazia: Veja doutor o tamanho do meu problema.
O doutor delicadamente disse: - Meu amigo, sinto lhe dizer que a minha secretária tem toda a razão. O seu problema tem de ser resolvido com um especialista em problemas intestinais.
- Não doutor, estou seguro que o senhor está enganado. Meu problema tem que ser resolvido aqui.
O doutor, observou o individuo cuidadosamente e logo disse:- Okay meu amigo. Eu admito que eu posso estar enganado. Mas  eu só solucionarei o seu problema se você me explicar qual é a relação cientifica entre os seus olhos e esta grande merda que você traz nesta lata de leite.
O individuo meio abobalhado respondeu: - Doutor, este é o xis do problema pois cada vez que eu vou no sanitário defecar esta grande obra, eu choro, Doutor... Eu choro muito.
Depois de escutá-la Romeu se manifesta: - A piada é engraçada e alegoriza uma parte importante da ignorância e da alienação nacional popular. Mas, como podemos observar, ainda que seja uma piada estereotipada sobre o povo brasileiro, o individuo representado na piada é um sujeito potencialmente inteligente, um sujeito capaz de pensar e fazer relações logicas entre objetos e acontecimentos.  O  que falta a este individuo é educação adequada e informação fundamentada racional e/ou cientificamente relevante.  Este individuo (nacional ou internacional) necessita parar de falar e atuar com base na percepção imediata dos seus sentidos e da suposta verdade do dogma religioso de evangelistas de todo tipo.
Egroje responde: - Concordo com você. Faz uma pausa, olha o relógio e fala: Tenho que ir mas para concluir esta conversa neste momento, gostaria de repetir o que disse antes: Mesmo estereotipada, esta piada ilustraria relativamente, não somente o  comportamento  da maioria do povo brasileiro mas se aplicaria também ao comportamento da maioria do povo estadunidense, do povo europeu, do povo latinoamericano bem como a todos os povos explorados economicamente, dominados politicamente, e colonizados culturalmente pela classes dominantes nacionais e internacionais.
Romeu finaliza: - Como trataram de nos ensinar Darcy  Ribeiro e Paulo Freire, dois dos mais brilhantes educadores brasileiros da história do Brasil, não é o povo brasileiro que deve ser responsabilizado  por ter estado vivendo durante séculos subjugado pela exploração econômica, pela dominação politica, pela ignorância e pela alienação humana. Os representantes da classe dominante do capitalismo neoliberal são os atuais e únicos responsáveis pela injustiça social, pela degradação humana e pela infame ignorância a que submetem o povo do nosso país.
-Bom Romeu,  tenho que ir agora. Continuaremos a conversa num outro dia. Bye, Bye, homem. See you later, aligator.
- After awhile crocodile.

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