Norma Odara Fes Brasil de Fato | São Paulo (SP)
Os vazamentos de áudios envolvendo o presidente
golpista Michel Temer (PMDB) e Joesley Batista, um dos donos do frigorífico
JBS, foram veiculados em primeira mão pelo jornalista Lauro Jardim, do jornal
"O Globo", por volta das 19h da noite desta quarta-feira (17). A
principal acusação era de que Temer teria autorizado a compra do silêncio de
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na prisão. Em seguida, o Plantão da Globo anunciava o
escândalo e prometia dar mais detalhes e informações no Jornal Nacional.
Durante a apresentação do jornal, os âncoras
William Bonner e Renata Vasconcellos dividiam a escalada (abertura do jornal,
elencando as principais notícias) destrinchando a denúncia do jornal impresso.
Horas depois, o Jornal da Globo, que encerra a sequência de noticiários do dia
da emissora, anunciou que teria duas edições por conta do furo de reportagem.
No dia seguinte, logo após Temer se
pronunciar afirmando que não iria renunciar, os áudios das gravações
foram liberadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e relator da
operação Lava-Jato, Edson Fachin. Foi quando se percebeu que, ao fundo da
gravação, Temer e Joesley ouviam CBN, emissora de rádio que também faz
parte das Organizações Globo.
"A mesma emissora que apoiou o impeachment
da ex-presidenta Dilma Rousseff agora parece orquestrar a queda do presidente
golpista Michel Temer", avalia o jornalista, sociólogo e professor
aposentado da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
(ECA-USP), Laurindo Lalo Leal Filho:
"A linha editorial das Organizações Globo,
jornal, rádio e televisão é a linha editorial de controle do poder. (…). Ela
exerce o papel de partido político – ela e os outros grandes meios de
comunicação no Brasil, como a Folha de S.Paulo, a Editora Abril e o
Estadão formam um partido político aliado a setores do Judiciário. Nós temos um
partido político que combina forças da mídia com forças do Judiciário,
trabalhando articuladamente".
Na análise de Leal, a estratégia da Globo é
derrubar Michel Temer e apoiar eleições indiretas, colocando a presidenta do
STF, Cármen Lúcia, como próxima a assumir na linha sucessória da Constituição
Federal.
Segundo o Datafolha, 61% da população avalia a
gestão do governo Temer como ruim ou péssima, 28% consideram regular e 9% boa
ou ótima. Frente a essa baixa popularidade e à crise econômica, Temer foi
perdendo influência, como defende Lalo Leal Filho :
"Um governo com este tipo de popularidade tem
muita dificuldade de implementar reformas, ainda mais reformas que foram
contestadas nas ruas. A greve geral do dia 28 mostrou isso, levou talvez a
Globo a perceber que este governo não tinha condições de levar essa política à
frente".
O jornalista e fundador do site "Opera
Mundi", Breno Altman, também acredita que a Globo está trabalhando pesado
para derrubar Temer. No entanto, contrariando o clichê do "quarto
poder", ele não a enxerga apenas como um partido. "A Globo atua como
o principal partido das elites, mas ela também tem interesses comerciais e
jornalísticos do ponto de vista de disputa de clientela. São suas
contradições".
Para ele, a denúncia contra o presidente da
República foi "um pacto político que surpreendeu em larga escala todas as
forças políticas e sociais, econômicas e midiáticas, todos os campos políticos
do país, a direita e a esquerda".
A história se repete como farsa
"Um exemplo foi o caso do ex-presidente
Collor, que foi praticamente levado à Presidência [da República] pela Globo.
Foi a Globo que criou o "caçador de Marajás" lá em Alagoas, o
transformou em figura nacional e o colocou no poder (…) Passado algum tempo,
como Collor não se mostrou tão alinhado aos interesses da Globo, ela apoiou a
famosa campanha dos 'caras pintadas', e conseguiu seu impeachment",
recorda o professor Lalo Leal Filho sobre um episódio recente da história.
Para Breno Altman, há três hipóteses dos próximos
passos. A primeira divide os meios de comunicação para uma certa recomposição
para manter Temer:
"O principal veículo a sustentar isso é o
Estadão, ainda que aceite a gravidade das denúncias. Mas há setores
empresariais, dos meios de comunicação, das forças armadas, que acham melhor
preservar Temer mesmo que ele seja investigado pelo STF. Seria melhor
carregar o mandato dele até o final do que reabrir a disputa pelo comando do
Estado".
A segunda hipótese é um outro setor, que envolve a
Globo, querer se livrar do presidente golpista rapidamente. "Eles
vão forçar sua denúncia e, imediatamente, encontrar uma saída por
via indireta, pelo Congresso Nacional, para que essas reformas possam ter
continuidade e para que o projeto político do golpe tenha seguimento".
A terceira é que a campanha de "Diretas
Já" ganhe força, e a saída para restabelecer a democracia seja pelo
campo popular. "É uma divisão, portanto, das classes dominantes e dos
meios de comunicação e uma tentativa do meio popular de criar um clima de
mobilização", conclui Altman.
Para o membro da coordenação nacional do
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) Gilmar Mauro, a melhor saída
também são as Diretas Já:
"A Globo está numa crise econômica há bastante
tempo e perdendo audiência. Além de tudo, também está perdendo o debate
político na sociedade. Por isso, eles estão desembarcando, mas querendo
construir uma alternativa por via indireta – e nós não podemos
admitir. Vamos conseguir superar o golpismo não só com a saída do Temer,
mas com a derrota política da Globo e a convocação de eleições diretas".
Edição: Camila Rodrigues da Silva
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