segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Democracia e utopia

Republico mais esta postagem do “Pensatas” de março deste ano. Com as recentes eleições nos Estados Unidos ela se torna atual.

Já falei aqui sobre o embuste da “democracia” ocidental. Principalmente nos Estados Unidos, cuja intenção igualitária à época de sua independência em fins do século XVIII – comandada pela então revolucionária burguesia – com o passar do tempo transformou-se num reacionário poder da máquina industrial-financeira, manipulada pela grande mídia. O que existe hoje e de fato é uma “ditadura da burguesia”. Com vícios e contradições semelhantes aos que a história propiciou na prática às teses de Marx (1). Na verdade a livre manifestação de opinião, tão decantada pelo sistema, só existe enquanto essas opiniões não ameaçam verdadeiramente a manutenção do status quo. Tudo é aparência, tudo um jogo de propaganda que visa enganar o cidadão comum, dando-lhe a sensação de estar vivendo uma situação democrática.
A origem da definição de demokratia (democracia) é encontrada em Aristóteles no seu livro Politica. Na Grécia antiga talvez tenha funcionado, mas daí em diante as tentativas foram desastrosas. Tanto na França pós-queda da Bastilha quanto nos EUA e outros países da Europa, as “aventuras” redundaram em fracassos, que, em grande parte das vezes culminaram em regimes totalitários, como foram os exemplos da própria França revolucionária a qual sucedeu o império napoleonico, quanto mais recentemente o da República de Weimar na Alemanha, em que uma constituição considerada das mais democráticas de todos os tempos deu lugar ao governo nazista.
No entanto a grande maioria dos países nunca conseguiu alcançar nem mesmo a farsa democrática. Na América ibérica, não indo muito longe, no Brasil, democracia (mesmo em arremedo) é uma realidade que jamais conhecemos. Falam em prosa e verso que vivemos um período democrático, mas, na verdade nossa tradição de excessões vem desde os tempos da colônia (2) e impede que alcancemos ao menos uma encenação (como a estadunidense). No império ela era um “teatro mambembe” em que somente votavam a nobreza e as classes dominantes em partidos que também as defendiam. A história de república é uma sucessão de votos de “bico-de-pena”, levantes e golpes militares, além de longos períodos de ditadura explícita.
Enquanto isso, os estadunidenses tentam impor à força das armas o que “pensam” ser um pensamento democrático em países como o Iraque ou o Afeganistão, que nem sabem o seu significado e teriam que procurar seus próprios caminhos para alcança-lo. Na realidade, tão utópica quanto o socialismo, a democracia ainda é um sonho a ser alcançado pela humanidade. Talvez um dia, se resistirmos à destruição do planeta, que nós mesmos estamos ajudando, conseguiremos chegar lá. E digo isso porque democracia e socialismo são metas a serem alcançadas em um conjunto de “liberdade, igualdade e fraternidade”. Um conceito inexiste sem o outro.

(1) O termo “ditadura do proletariado” não significava em suas origens a ditadura de um só partido, mas uma forte presença revolucionária para extinguir o poder das diferenças sociais geradas pela exploração ao longo de séculos. O que aconteceu na URSS foi a instalação de uma ditadura de partido único que burocratizou, corrompeu e apodreceu o regime.
(2) No Brasil Colônia eram proibidos tanto o ensino universitário quanto a imprensa. Somente a vinda da família real portuguesa – que transformou este país tropical na sede do reino – possibilitou uma abertura para o ensino e a publicação de livros e jornais.

9 comentários:

Ieda Schimidt disse...

Mais uma vez concordo cotigo. Tuas análises da burocracia soviética são sempre bem posicionadas e excelentes.

Jonga Olivieri disse...

Obrigado, Ieda, mas sei que pensamos e estejamos de acordo neste sentido.

Anônimo disse...

Não alcanço tal profundidade de análise como a sua. Pra mim, a democracia que temos é suficiente. sei que tem lá suas falhas, mas que é, é.
Otávio

Jonga Olivieri disse...

É, cara, para isso existe todo este complexo mundo da comunicação de massas. Para isto existe esta máquina de ilusões que tenta nos convencer que os "eleitos" pelo povo --com o dinheiro do grande capital, e, na verdade comprometidos com este pelo poder finaceiro-- está a nos servir.

Anônimo disse...

Gosto demsis de suas teses. E quanto mais "radicais", melhores.
O melhor é que elas tem um fundamento. Elas me convencem, me fazem pensar um pouco em certos conceitos que estabelecemos e que de repente podem não ser bem assim,mas porque estamos nos condicionando a ele.

Jonga Olivieri disse...

É isso mesmo Maria. Na maioria das vezes (unideimensionais que somos), julgamos estar pensando uma determinada coisa e não vemos que fomos condicionados a ir para aquele lado.
Essa é a máquina a que me refiro.
Marcuse a definiu muito bem.

Eliana BR disse...

Entre utopia e pragmatismo, como disse hoje Daniel Cohn-Bendit, você sabe que se pode realmente - pelo menos por enquanto - falar em democracia na França? As ameaças estao por todo lado mas por enquanto os enfants de la patrie estao resistindo.
Bises,
Eliana

Jonga Olivieri disse...

Sim Eliana... os 'enfants de la patrie' resistem, mas... na sua essência a "democracia" nos tempos do capitalismo está acoplada aos interesses econômicos dos grandes grupos. Aí na França não é, nem pode ser diferente.
E não podemos nos esquecer que este país foi o berço 'de la Revolution', mas também de Bonaparte; que teve a Queda da Bastilha, mas também o 18 de Brumário!

Jonga Olivieri disse...

Todavia o questionamento --característica do povo francês-- pode nos levar a "ene" interpretações sobre a democracia neste país.
Por outro lado, não podemos confundir o comportamento democrático do ponto de vista cultural com a democracia institucional. Esta última é que gera o que eles chamam de "democrecia".