sábado, 15 de novembro de 2008

O dia em que conheci um mito

Corria o ano de 1966. Eu e Ruy Raposo militávamos no POR-T (Partido Operário Revolucionário - Trotskista), Seção Brasileira da IV Internacional.
Acontece que, desde que entráramos para aquela organização tínhamos profundas divergências quanto a alguns de seus posicionamentos políticos. Já até falei neste ou no antigo “Pensatas” o quanto a “Quarta” era dividida. Havia mais de uma corrente na América... e também a tendência européia. Nós, no Brasil, ficamos quase que isolados em contato com os “Posadistas”, que tinha este nome em função de seu dirigente, J. Posadas, um militante argentino.
O fato é que Posadas e os “Posadistas” assumiam posições cada vez mais alucinadas em relação à guerra atômica, aos caminhos da Revolução Cubana e até a teses estapafúrdias sobre a existência de discos voadores. O que nos deixava em situação de divergência cada vez mais acentuada com o núcleo dirigente. Tentamos estabelecer contatos com os trotskistas europeus, dirigidos por Michel Pablo, mas as tentativas forma em vão.
Tomamos então conhecimento da existência do (MCI) Movimento Comunista Internacionalista. Algo que nos agradou bastante, por ser também uma organização de orientação trotskista. Teríamos que ir a São Paulo para estabelecer contato com eles. Compramos as passagens e fomos.
Nosso primeiro encontro foi com um sujeito de quem não me lembro o nome. Fomos à sua casa, no bairro de Higienópolis, e tivemos uma excelente impressão. Ele então anunciou que iríamos encontrar o “velho”. Já sabíamos quem era, e, apesar de o conhecer de nome, nunca estivéramos com ele. E assim fomos encontrar Hermíno Sacchetta (1). Antigo militante revolucionário, trotskista histórico, Sacchetta era uma figura vivida e extremamente coerente, que atravessara os anos da ditadura Vargas e agora enfrentava a existência da ditadura militar.
Após um encontro cheio de despistes e vai e vens, fizemos um excelente contato e trocamos muitas idéias. Foi um final de tarde muito agradável. E considero Sacchetta, ao lado de Edmundo Moniz, uma das figuras mitológicas que conheci. Todavia nossos entendimentos não seguiram adiante, porque pouco tempo depois o Partido caiu no Rio devido a uma infiltração... mas isso é outra história que um dia eu conto.

(1) Hermínio Sacchetta (1909-1982), consta no MIA (Marxists Internet Archive) como “brasileiro, nascido em São Paulo, iniciou sua carreira na imprensa, como revisor, no Correio Paulistano. Engajou-se na luta revolucionária através do Partido Comunista Brasileiro, em 1932, onde atuou no setor de agitação e propaganda chegando a secretário do Comitê Regional de São Paulo; foi ainda um dos principais editores do jornal “A Classe Operária” (órgão central do PCB) até 1937, quando foi expulso da organização sob alegação de dissidência trotskista. Preso político durante o Estado Novo, após sua libertação, em novembro de 1939, participou da fundação do Partido Socialista Revolucionário, Seção Brasileira da IV Internacional nos anos 40 e 50 impulsionando o jornal Orientação Socialista. Perde o contato com os agrupamentos internacionais que reivindicavam o trotskismo com a crise em 52/53 e o fim do centralismo democrático na IV Internacional. Posteriormente atuou na Liga Socialista Independente, de tendência luxemburguista e, nos anos 60, no Movimento Comunista Internacionalista. Mestre do jornalismo colaborou na formação de inúmeros profissionais e contribuiu com a imprensa diária e a de divulgação política.”

7 comentários:

Ieda Schimidt disse...

Hermínio Sacchetta teve um percurso impecável em sua militância. Feliz você em tê-lo conhecido.
E que bom que você publicou algo neste nível. Pelo menos evita os comentários que aconteceram na última postagem. Caspt!

Jonga Olivieri disse...

E ele me causou a melhor das impressões. Poucas vezes conheci uma pessoa tão carismática.
Quanto ao nível... Ieda querida, é o tal caso, de vez em quando é até bom quebrar a seriedade com o "lixo" cultural.

Anônimo disse...

Não sei quem é o Sachetta, mas parece ser importante. tanto quanto o Prestes?

Jonga Olivieri disse...

Depende do prisma. O Prestes era uma figura que a grande mídia divulgou em grande escala.
No entanto, Prestes era, além de stalinista um reformista, não um revolucionário. Um petit bourgeois; nunca foi além disso.
Já o Sacchetta era de fato um intelectual e um profundo conhecedor do Materialismo Histórico.
Neste sentido o considero mais importante que o Prestes.

Anônimo disse...

Esse eu nunca tinha ouvido falar.
Otávio

Anônimo disse...

Eu também, como o JR não conhecia o Herminio Sacchetta.
Acho que a biografia publicada no MIA é excelente e mostra a sua importância política.
Parabéns por ter conhecido uma pessoa tão importante.

Jonga Olivieri disse...

É gente, o Sacchetta não era muito conhecido fora de certos círculos de esquerda.