quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

O escritor e o capitalista

Conheci Antônio Torres na Salles em 1981, quando ele foi trabalhar naquela agência fazendo uma parceria com o inesquecível diretor de arte Joaquim Pêcego. Bem humorado, logo me apelidou de “capitalista” ao saber que, baiano como ele – que é de Junco (1) – eu era nascido na capital, Salvador. Isso virou uma marca registrada, pois toda vez que lhe telefono vou logo dizendo: “aqui é o seu capitalista”, palavras que me identificam de imediato.
Outra coisa que me surpreendeu foi um de seus primeiros comentários, em que afirmava que a melhor coisa que lhe aconteceu havia sido deixar de ser diretor de criação na Denison para ser redator naquela agência. Afinal, um redator é responsável pelos seus textos e pronto! Ademais, já escritor à época, precisava ter mais tempo para escrever seus livros, nem que na calada da noite.
Nosso convívio na Salles foi excelente. Mas, nossa grande aproximação deu-se anos depois, após a minha volta de Portugal. Torres trabalhava na Publinews, que ficava na rua Dona Mariana, e eu na VS, a poucos passos, na Guilhermina Guinle. Ambos fazendo regime, todas as semanas almoçávamos no restaurante Natural da 19 de Fevereiro. Foi um período agradável, repleto de papos longos e riquíssimos. Entre outras coisas, Antônio Torres também havia trabalhado em terras lusas, e, mais coincidentemente, na cidade do Porto.
Naquela ocasião, também acompanhei todo o desenvolvimento de “O cachorro e o lobo” (2), o livro que ele escrevia no momento. Era emocionante ir almoçar com o escritor e amigo e ouvir dele o passo-a-passo e as peripécias na feitura de um livro. Algo que me deixava fascinado, principalmente porque a simplicidade é uma de suas marcas registradas. Torres sempre contava tudo com muita naturalidade e entusiasmo, emoção e propriedade. Antes mesmo de conhece-lo, já havia lido “Carta ao Bispo”, “Adeus, velho” e “Um táxi para Viena d’Áustria”. Mas depois li mais alguns de seus livros, como “Um cão uivando para a lua”, “Essa terra” e “Balada da infância perdida”.
Durante muitos anos Torres escreveu uma coluna no caderno de livros e cultura do Jornal do Brasil, da qual, aliás, eu era seu leitor assíduo. Deixou a propaganda alguns anos depois para se dedicar apenas à literatura e palestras que realiza em todos os cantos sobre o ofício de escrever. Foi agraciado como “Chevalier des Arts et des Lettres”, pelo governo francês. E também fez parte de vários grupos de escritores e intelectuais em acontecimentos literários no exterior. Recentemente, foi indicado e concorreu a uma cadeira na Academia Brasileira de Letras.
Após sua saída da publicidade continuamos a nos encontrar quase que todas as semanas, para caminhar no calçadão de Copacabana. O habitual era andarmos até Ipanema e tomarmos um café no bar da livraria Letras & Expressões daquele bairro. Aliás, o seu nome batiza o bar da mesma livraria no Leblon. Ele merece...

(1) Junco, atualmente Sátiro Dias, é uma cidade de 20.000 habitantes próxima a Alagoinhas.
(2) Os outros livros de Antônio Torres são: Um cão uivando para a lua – 1972, Os homens dos pés redondos – 1973, Essa terra – 1976, Carta ao bispo – 1979, Adeus, velho – 1981, Balada da infância perdida – 1986, Um táxi para Viena d’Áustria – 1991, O centro das nossas desatenções – 1996, O cachorro e o lobo – 1997, O circo no Brasil – 1998, Meninos, eu conto – 1999, Meu querido canibal – 2000, O Nobre Sequestrador - 2003, Pelo Fundo da Agulha – 2006, Menu, o gato azul - 2007 (história para crianças), Sobre pessoas - 2007 (crônicas, perfis e memórias). Tem suas obras publicados na Argentina, em Cuba, e mais França, Alemanha, Itália, Inglaterra, Estados Unidos, Israel, Holanda, Espanha e Portugal.

8 comentários:

Ieda Schimidt disse...

Confesso que nunca li nada de Antônio Torres, mas fiquei curiosa de conhecer alguma coisa a partir desta tua matéria.
Que livro devo procurar?
Qual, na tua opinião vai me dar uma visão melhor do conjunto da obra dele?

Jonga Olivieri disse...

Talvez começar pelos mais antigos, como "Carta ao Bispo" ou "Essa Terra" e depois ir para os mais recentes creio ser um bom caminho.

Anônimo disse...

Torres sempre foi muito respeitado no cenário da publicidade carioca. Mas, além disso se afirmou como um dos grandes escritores e intelectuais brasileiros de hoje.

Jonga Olivieri disse...

Sim, JR, o Torres hoje é um dos maiores escritores brasileiros.
Eu, independente de ser amigo dele, gosto muito dos livros que escreve. E da variedade, que abranje desde os seus romances às crônicas e relatos.
Um escritor completo.

Anônimo disse...

Vou procurar algum livro dele para ler.
Otávio

Anônimo disse...

Que surpresa agradável. Gosto muito dos livros do Antônio Torres, e já assisti uma palestra dele mas não sabia que vocês eram amigos.

Jonga Olivieri disse...

Você certamente via gostar dos livros do Torres, Tavinho.

Jonga Olivieri disse...

O Torres é um amigo solidárioe companheiro em todos os momentos.
Uma figura humana incrível.
Por sua sensibilidade é que escreve tão bem.