Um texto do professor Jorge Vital de Brito Moreira. Bom
proveito!
Dois amigos, jovens estudantes estadunidenses, viajaram à Europa para
conhecer Portugal, Espanha, França e Itália. Quando estavam almoçando num
restaurante português, ao ar livre, eles foram abordados por um estrangeiro, um
jovem europeu, que precisava de alguma informação. Ele disse: “Bom dia, poderiam me informar onde se
encontra a Praça de D. Pedro IV?”
Um dos estudantes olhou pro colega ao lado e perguntou-lhe: “What did he say?” (Tradução: O que ele
disse?)
O colega respondeu: “I didn’t
understand anything that he said.” (Não entendi nada do que ele disse.)
Sem estar seguro do que acontecia, o jovem europeu decidiu
certificar-se perguntando: “Vocês falam português?”
Percebendo que os dois norteamericanos não entendiam a língua
portuguesa, decidiu mudar para a língua castelhana. Para estar seguro,
perguntou primeiramente: ¿“Hablan ustedes
español?”
Os dois colegas se olharam e, simultaneamente, perguntaram um pro outro:
“What did he say?” (O que ele disse?)
Constatando que os dois norteamericanos não entendiam o espanhol, mudou
rapidamente para a língua francesa e perguntou: “Parlez vous français?”
Novamente, os dois se olharam perguntando simultaneamente: “What did he say?”
Um deles respondeu: “Once again...
I didn’t understand anything that he said” (Novamente… não entendi nada do
que ele disse.)
Confirmando que os dois norteamericanos tampouco entendiam o francês,
mudou rapidamente para a língua italiana e perguntou: “Parlate voi italiano?”
Eles se olharam e perguntaram novamente: “What did he say?” e o colega respondeu: “Shit, I didn’t understand anything that he said” (Merda, não
entendí nada do que ele disse.)
Concluindo que os dois não entendiam português, espanhol, francês ou
italiano, o jovem europeu decidiu agradecer e despedir-se nos quatro idiomas
que falava: “Obrigado, adeus”… “Gracias,
adios”…. “Merci, au revoir”… “Grazie, arrivederci”.
Porém os estudantes estadunidenses não responderam porque tampouco
entenderam o que o europeu falou. Ficaram calados por alguns minutos. Depois,
um deles quebrou o silêncio e perguntou ao colega: “Don’t you think that we should learn a foreign language?” (Você não
acha que deveríamos aprender a falar um idioma estrangeiro?)
Mas o outro, presumido, concluiu o diálogo: “What for? That
European guy knew how to speak four foreign languages and that didn’t help him
communicate well with us at all. It was totally worthless.” (Para que? Esse jovem europeu aprendeu a falar quatro idiomas
estrangeiros e não lhe ajuda a se comunicar com o mundo. Não lhe serve para
nada).
Esta anedota, ilustra e resume a minha experiência com a cultura
hegemônica e com a atitude de parte significativa dos estadunidenses para as
pessoas e as línguas estrangeiras. Em poucas palavras, esta parte dos estadunidenses está convencida que a
única língua que tem importância no mundo é a língua inglesa. Assim, eles se
comportam como indivíduos ignorantes, arrogantes e prepotentes, esquecendo
(convenientemente) que a importância e a hegemonia da sua língua inglesa foram
impostas às diferentes culturas pela força, pela violência, pelas invasões,
pelas guerras contra os países da América Latina, da África e da Ásia.
Sou brasileiro e estou casado com uma estadunidense. Além de ser a mãe
de nossas duas filhas, é uma pessoa maravilhosa que sabe e ensina literatura
latinoamericana e língua espanhola em nível universitário. Atualmente, tenho
cidadania norteamericana e vivo nos EUA por mais de 20 anos. Durante todo esse
período, tenho me relacionado com estadunidenses de diferentes status social (principalmente a classe
média), raças, gêneros sócio sexuais e religiões e tenho observado as seguintes
características da cultura dominante: ignorância, arrogância e prepotência.
Partindo da minha experiência pessoal, darei um exemplo que ajuda a ver
o que a anedota acima ilustra e resume tão bem. É um exemplo tomado de
situações que se repetem frequentemente por onde tenho vivido; e a frequente
repetição sugerem que a falta de conhecimento e a presunção (de que eles são
proprietários da verdade) se configuram como características profundamente
arraigadas na cultura hegemônica da maioria dos estadunidenses.
Mister John Philip de Sousa, um
dos mais famosos músicos estadunidenses, tem descendência portuguesa como se
pode notar pelo seu último nome: o da família, Sousa. Os estadunidenses acabam
de celebrar o dia da independência no passado 4 de julho e, nesta data,
enaltecem a figura de John Philip Sousa pois é o compositor da marcha oficial
dos EUA The Stars and Stripes Forever. É chamado
o Rei das Marchas, por
haver composto dezenas de marchas que são muito conhecidas e tocadas, não
somente neste país, mas em todos os países submetidos ao domino econômico,
político e cultural do imperialismo
dos EUA.
Frequentemente quando pronuncio o
ultimo nome do compositor Sousa na frente de estadunidenses, eles me corrigem pronunciando imediatamente “Suza”. E não querem tomar consciência de que o último nome dele é um nome português.
Faz alguns anos, entrei no restaurante da University of Minnesota e encontrei o professor de literatura
portuguesa e diretor da minha tese doutoral.
Sentei-me a seu lado e comecei a
queixar-me dessa atitude ignorante/prepotente dos estadunidenses. Depois de me
escutar, ele falou tranquilamente:
“Não fique zangado. Como você sabe, sou filho
de portugueses mas nasci nos EUA e tenho morado aqui toda minha vida. Falo
português, mas o inglês é minha primeira língua. Pronuncio as palavras inglesas
de um modo natural, fluente e corretamente como todo nativo-falante daqui. Mas,
frequentemente me deparo com pessoas que
me chamam R. Suza. Mas quando eu lhes informo que sou português e que a
pronuncia correta do meu nome é Sousa, não Suza, eles fazem uma cara de surpresa, mas não me
fazem caso: ignoram o que eu digo e continuam me chamando Suza. Tenho
atualmente 48 anos mas faz pelo menos 40 anos que corrijo meus
compatriotas e não me fazem caso.”
Depois de falar com o professor
fiquei mais tranquilo porem a mesma coisa continua acontecendo quando falo o
nome de um lugar ou de uma pessoa de origem estrangeira (judia, italiana ou
francesa). Imediatamente me corrigem, ignorando torpemente que o nome das
pessoas mencionadas não são nomes de
raízes na língua inglesa.
Por outro lado tenho sido professor nos EUA e tenho ensinado língua,
literatura, cultura brasileira e latinoamericana (em português e espanhol) para
estudantes dos EUA. E de vez em quando aparece
na sala de aula um aluno ou aluna estadunidense que se recusa a aceitar
minha pronúncia de certas palavras da língua portuguesa.
Conforme seu parecer minha pronúncia brasileira está errada. Quando
peço-lhes uma razão do porque a minha pronuncia está errada, o aluno ou aluna
me explica que seu antigo professor de português era um(a) norte americano(a) e
que o/a professor(a_ pronunciava aquelas mesmas palavras de um modo diferente.
Assim, o/a aluno(a) concluía que o professor anterior estava certo e que eu, um professor
brasileiro, estava errado.É quase inacreditável que um número significativo de pessoas deste país
possam chegar a um nível tão escandaloso de prepotência e chauvinismo. Recusar
ou corrigir a pronúncia de um professor (nativo falante) de sua própria língua
pelo fato de que ele/ela não pronuncia as palavras da mesma forma que um
professor(a) estadunidense (um não nativo falante) é simplesmente ridículo.
Mas não acontece exclusivamente com a língua portuguesa ou espanhola.
Estou informado que essa situação se repete na relação entre estudantes e
professores de outras línguas estrangeiras também.
Às vezes tenho vontade de rir, ironizar e ridicularizar as pessoas e os
estudantes portadores de atitudes tão ignorantes e preconceituosas, mas, na
maioria dos casos, me contenho. Outras vezes não; outras vezes não me contenho
e prefiro ironizar para deixarem de ser
bestas; para tomarem consciência da sua ignorância, prepotência, arrogância na relação
com outras culturas, religiões e línguas estrangeiras.
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9 comentários:
Qye posatagem agradável esta do Professor.
Gostei demais!
Aliás, falar em piada, gostei muito da sua anterior sobra aobfe a "Grobo"! Valeu....
Eles são assim mesmo. Aliás, antes deles os franceses e os ingleses eram também!
Imperialistas são "obtusos", esta é a verdade!
Tanto entre indivíduos como nações, convencionou-se a liderança sempre pertencer o mais rico e mais influente e normalmente essa liderança é conquistada informalmente pela imposição de poder do mais forte sobre os mais fracos.
Isso no nível do indivíduo é denominado usurpação do outro e no nível das nações chamam-se imperialismo. Imperialismo é a nação mais rica tentando mandar em todo o resto.
Foi assim com os Sumérios, os Persas, os Gregos, os Romanos e na modernidade com a França Napoleônica, a Inglaterra Vitoriana, e hoje os Estados Unidos.
Simplesmente genial!
Tavim
Gostei da historinha do Sousa.
Há muitos anos atrás vi um filme sobre ele chamado "Marcha Triunfal" e me lembro que a lindíssima Debra Paget, mas não consigo lembrar o ator que fazia o papel dele.
Tomando o sentido da palavra "imperialismo", tanto o sentido concreto - domínios territoriais e protetorados - quanto o sentido abstrato - ingerência nos assuntos internos de outros países - e examinando a História desde a emergência dos EUA como potência, podemos tirar duas conclusões.
A primeira, que os EUA já tiveram duas colônias (Cuba e Filipinas) a até hoje mantém Porto Rico. Conta-se também numerosas intervenções menores, sobretudo na América Central.
Segundo, que a imagem que é passada da vida americana é vistosa. Isso ocorre porque o seu principal veículo de disseminação é a indústria do entretenimento, especialmente o cinema.
Paulo Henrique
Exceção se faça a alguns guetos intelectuais, os americanos rejeitam, principalmente em cinema, toda outro idioma que não seja o seu. O que é revelador de uma pobreza cultural lancinante. De alguns sucessos estrangeiros internacionais são realizados 'remakes' estapafúrdios. Até mesmo ''Dona Flor e seus dois maridos'' teve uma versão americana, ''Meu adorável fantasma'', de Robert Mulligan, com Sally Field, um tremendo fracasso como não poderia deixar de ser.
Caro Jorge, concordo com você mas prefiro dançar um forró do que um for all.
Caro Jorge, concordo com você mas prefiro dançar um forró do que um for all.
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