sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Ainda de cinemas

Postei ontem neste blogue um artigo sobre alguns cinemas que marcaram época no Rio de Janeiro a partir da depedração do Vitória. Deu-me vontade de falar um pouco mais sobre eles. E alguns outros.
Os três Metros no Rio eram caracterizados pelo ar condicionado, numa época em que isto ainda era raro. Lembro que lá em casa tinha apenas um daqueles mágicos aparelhos muito propícios para a temperatura escaldante da cidade. Mas olha, passar na porta do Metro Copacabana em dia de “verãozão” carioca era uma dádiva dos deuses. Tinha gente que ficava parada na porta só pra refrescar um pouquinho e ganhar forças para continuar a caminhada.
Naquele cinema assisti várias vezes, ainda criança, os famosos “Festivais Tom & Jerry” que passavam todas a manhãs de domingo com as maldades daquele ratinho sádico contra o idiota do gato, a vítima que se supunha ser o “vilão”. Mas, também a Metro era quem produzia os filmes de Tarzan, e, pelo menos alguns dos musicais de Elvis Presley, isso também e ainda nos finais dos 50 e início dos 60. O cinema ia abaixo quando o roqueiro começava a cantar. E exibir o seu característico rebolado.
Ao lado, quase coladinho mesmo, ficava o Art-Palácio que me despertou quando na adolescência começava a me interessar pelo cinema europeu. Vi muitos filmes da Nouvelle Vague, como “Trinta anos esta noite” de Louis Malle e italianos, a exemplo de “La dolce vita” de Fellini, obra que me marcou profundamente. Era uma sala mais simples, porém ampla, como grande parte dos cinemas da época.
E até digo isso porque no posto seis, tinha um mini-cinema, o Alvorada, que se intitulava “cinema de arte” e que também exibia filmes europeus em quantidade. Por exemplo, “Morangos Silvestres” e “O sétimo selo” de Bergman eu assisti ali. Cinemas do gênero surgiram depois, tais como o Riviera, também no mesmo posto seis que tinha a característica de promover festivais de países cuja cinematografia era pouco conhecida por essas bandas. Como o tcheco, o polonês, o japonês, o indiano e por aí afora. Aquela sala, proporcionou-me ver filmes como “Um dia, um gato” de Vojtech Jasny ou “A faca na água” de Polansky.
Copacabana tinha muitos cinemas. O Ritz foi um dos primeiros a ser derrubado e ficava entre a Figueiredo Magalhães e a Siqueira Campos. Lembro de ter assistido um filme de Cantinflas no Ritz. Na própria Siqueira Campos ficava o Flórida. Mais o Ricamar, o Rian, que tinha o privilégio de ficar na avenida Atlântica, de frente par o mar. O Alaska, cinema quase na vertical. E um no Leme que eu nem me lembro mais o nome. Além do famoso Caruso que também era excelente.
Saindo de Copacabana, o saudoso Veneza e o velho São Luis. E digo o velho porque os que foram construídos no lugar dele são arremedos daquela esplendorosa sala exibidora. Vizinho do velho São Luis, o também velho e inesquecível Lamas, que nos dias atuais foi para não muito longe, no Flamengo. Também no Largo do Machado um poeira em que eu ia muito, o Politeama. Era enorme. Pra se ter uma idéia hoje há um grande super-mercado no mesmo lugar. Pertinho dali, indo na direção do Catete o Asteca. Depois veio o Condor Largo do Machado, que também distribuía muitos filmes europeus. O Condor, quando acabou sofreu uma reforma e virou dois, os Largo do Machado I e II.
Um capítulo a parte foi o Paissandu, que – criminosamente (1) – cerrou as portas no ano passado. Naquela sala, para além dos grandes lançamentos do cinema de vanguarda no mundo, ainda havia o Festival de curta-metragens patrocinado pelo Jornal do Brasil. Mas filmes como “Cinzas e diamantes” de Jerzy Andrzejwski e “Kanal” de Wajda passaram em sua tela. Ou “O incidente” de Larry Peerce, uma película da Escola Independente de Nova Iorque. O Paissandu foi a marca de uma geração que levou o seu nome. E ao lado o bar Cinerama (que hoje ostenta o “criativo” nome de Garota do Flamengo), reunia os espectadores após os filmes para longos papos e análises regados a muito chope. Quem viveu aquela época, viu. E eu, por acaso estava lá. Joguei muita conversa fora e tomei porres homéricos naquelas mesas.
No Leblon, o próprio Leblon, o Miramar que como diz o nome, também ficava na praia. Em Ipanema o Astória, o Ipanema e o Pirajá. Até no jardim Botânico, tinha o Floresta, um poeira horroroso que caracterizava os chamados cinemas de bairro. Mas eram baratíssimos; e viviam cheios.
Botafogo tinha vários poeiras. O Nacional, quase na esquina da Real Grandeza com Voluntários. Este depois passou por uma reforma, subiu de categoria e foi rebatizado como Bruni-Botafogo. Mas tinha também o Botafogo (onde hoje é o Estação Unibanco) que um dia havia sido o Star. E o Guanabara. Um “poeirão” quase na praia, esquina com a rua da Passagem. Este cinema tinha a característica de nas noites de verão abrir as portas laterais para que ficasse mais fresco. Neste bairro, depois surgiram o Ópera e os Coral e Escala, esses cinemas gêmeos, que estrearam com os filmes de André Cayatte “Confissões de um homem casado” num e “Confissões de uma mulher casada” no outro. Os Coral e Escala, com a decadência viraram salas de filmes pornô durante muitos anos, e hoje o local abriga o complexo do Unibanco Arteplex.
Na cidade havia também os cinemas “passa-tempo”. Tinham este nome porque exibiam curtas, na época chamados de shorts, desenhos e filmetes de todo o tipo. Nunca longa-metragens. Como seu nome dizia, tinha um relógio grande embaixo da tela e eram muito usados para se passar o tempo enquanto se esperava um compromisso qualquer. Você podia ficar o tempo que precisasse neles. O Cineac Trianon era o mais famoso deles e ficava na Avenida Rio Branco. Tinha um longo hall de entrada com atrações, como o famoso faquir que ficava dias sem água ou comida em cima de pregos numa redoma de vidro, cercado de cobras.
E na Tijuca? A praça Saens Pena era uma mini-Cinelândia. Tinham muitos cinemas ali. E nos arredores, como na Haddock Lobo e Conde de Bonfim. Mais longe um pouco, andando na direção da cidade havia o Madrid. E um outro cineminha (poeira) quase no Estácio, que eu não lembro o nome. Mas foi lá que uma ocasião, despenquei de Botafogo para assistir “O ladrão de Bagdá” em reprise, pois queria ver este famoso filme antigo de Korda com o ator indiano Sabú. Os poeiras tinha a vantagem de passar muitas reprises. Talvez por ser mais barato, mas era muito bom que isso acontecesse.
Tem ainda o capítulo dos subúrbios, mas desses não conheci nenhum. No entanto Madureira, Cascadura e Méier, ao que consta tinham muitos cinemas. E bons.

(1) Considero criminoso a prefeitura não haver tombado o Paissandu. Quando a rede Estações resolveu fechar a sala, as autoridades poderiam ter interferido para que continuasse a existir. Houve até um abaixo-assinado neste sentido, mas...

16 comentários:

Ieda Schimidt disse...

É guri, tua lembrança de tantos cinemas daí do Rio de Janeiro é fantástica.
E como te referes, cinemas hoje são todos tão iguais que fica difícil marcar em qual vimos algum filme, passado algum tempo.
Sinal dos tempos. pena que para pior.

Jonga Olivieri disse...

Realmente uma pena que pra pior.

Anônimo disse...

Você quase não esqueceu de cinema nehum daqueles tempos. Tinha um que eu acho que era Bruni Tijuca em frente ao Madrí. Mas sei disso porque fui criado naquele bairro e você eu sei que não.
Me parece que o Elvis não mantinha exclusividade com nenhum estúdio. Digo isso porque também assisti um filme dele ( era até preto e branco ) no Matro. Mas lembro de filmes dele na Paramount. pelo menos.

Anônimo disse...

Acho que conhecai a maioria deles. Pelo menos os de Botafogo eu ia demais. Assisti muito filme no Botafogo e no Gaunabara. Tinha a turma da bagunça que esculhambava um pouco. As vezes era uma bagunceira muito doida. Mas falar nisso, você pegou aquela turminha, acho que do leme que ia no Rian. Era horrível quando começava a gritaria.
Otávio

Jonga Olivieri disse...

É mesmo, tinha um cinema bem em frente ao Madrid. Mas bem mais recente.

Jonga Olivieri disse...

Esse negócio de bagunça em cinema era uma peste. Tinham piadistas ótimos, mas em compensação, aquelas turminhas de vândalos sem graça, gritaria! Era irritante.
Peguei essa "patota" que ia no Rian, considerada uma das piores da cidade.

André Setaro disse...

Você esgotou o assunto sobre os cinemas do Rio de Janeiro. Conheci-os quase todos citados.Além dos ''clássicos'' Metro e Paissandú, gostava muito do Ópera, onde, terminado o filme, gostava de ficar ali em frente a tomar chope. Se não me engano, havia dois ou três bares na frente do cinema. Ia muito ao Largo do Machado, porque na maioria das vezes ficava hospedado no bairro das Laranjeiras. O São Luiz era uma beleza, um verdadeiro monumento ao esplendor do espetáculo cinematográfico. Creio que a nova geração, acostumada com as salinhas dos complexos instalados nos shoppings, não pode ter idéia da magnificência do São Luiz, que era da rede de Severiano Ribeiro. Ainda pelo Largo do Machado, ia muito ao hiper 'poeira' Politheama, porque neste a programação era dupla.Era uma sala quente, sem ar condicionado, e tinha uma famigerada cortina que dava acesso à sala de exibição. Cortina sebosa, que dava nojo. Lembro-me que fazia verdadeiras peripécias para ver se entrava sem tocar nela. Mas era impossível. E houve a criação do Condor-Largo do Machado, dois cinemas numa espécie de shopping center que ficava quase ao lado do Politheama. Mas as salas, menores, já anunciavam a decadência dos 'palácios' da exibição. E, pegando a rua do Catete, o Azteca, com aqueles leões enormes (eram mesmo leões ou outros animais?) na porta, a denunciar a magia e o mistério de uma casa de espetáculos cinematográficos. Uma época que acabou. Vai-se ao cinema hoje como se vai a um shopping. Quem conheceu a época de ouro dos cinemas, e não só do Rio, permanece em estado de estupefação pelo declínio e decadência atual.

Jonga Olivieri disse...

O São Luiz realmente era deslumbrante, como, aliás, você bem definiru em seu comentário: “... um verdadeiro monumento ao esplendor do espetáculo cinematográfico.”
Gostei da “cortina sebosa” do Politheama. Coisa de cinema “poeira”, nem me lembrava deste detalhe! Mas é que este tipo de 'coisas nojentas' tinham em vários cinemas... "poeiras" claro.
O Condor-Largo do Machado começou com uma única sala, e de fato ficava numa galeria (que até hoje existe) no Lgo do Machado. Depois viraram duas. Os cinemeas, Largo do Machado I e II, que os sucederam, acabaram e hoje há uma “Universal” no seu lugar. Triste! Muito triste!
O Azteca, tinha esculturas de alguma espécie de dragão, ou algo, talvez, que remeta à cultura e mitologia das civilizações pré-colombianas.

André Setaro disse...

errata: declínio e decadência atuais.

André Setaro disse...

Não sei se você conheceu o Aliança, que ficava na Baixa dos Sapateiros. Tinha a cortina mais sebosa que conheci. Recordo-me que quando ia ao Aliança, vestia uma roupa já usada, prestes a ser lavada, porque para 'ultrapassar' a cortina o sujeito ficava com o cheiro intragável, insuportável, dela na roupa. Ao chegar em casa, punha toda a roupa para ser lavada. Mas, interessante, aguentava-se tudo por causa dos filmes, pela magia do cinema: o calor infernal, as cadeiras de madeiras (sujas), o cheiro de urina que se espraiava pela sala, etc.

Jonga Olivieri disse...

Gostei do preciosismo, André... valeu!

Mas curioso que quando voc~e diz que eu esgotei o assunto de cinemas, acho que falhei, porque esquci o Bruni-Tijuca, que o JR lembrou que ficava em frente ao Cine Madrid, aliás outro que hoje é Universal, mas não a Pictures, a outra mesmo. A igreja daquele bispinho maldito.
E também, falar em Bruni, o Bruni-Ipanema, que hoje é loja da Casa & Vídeo.

Jonga Olivieri disse...

Acho que cheguei a ir no Aliança. Fomos a muitos cinemas naqueles tempos.
André, os "poeiras" eram um caso à parte. Eram nojentos. Tinham uns que tinham pulgas, lembra? Chegava-se na sala e daqui a pouco sentia-se o pulinho nas pernas... dentro das calças... insupoertável, mas é o que você falou, s gente aguentava, a gente suportava.
Primeiro porque o precinho era camaradíssimo. Segundo porque cinema era uamcoisa saudável naquela época.
Uma questão cultural no seu sentido mais amplo.

Neusa disse...

Que saudade, das pre estreias do São Luiz nas manhãs de Domingo e de entrar pela porta do lado do Azteca, sem pagar.
De ver o Chico Buarque e turma matando aula nas tardes do Politeama!O tempo passa...

Jonga Olivieri disse...

Bem vinda Neusa. É sempre bom descobrir uma nova leitora que comenta...
É, você lembrou de coisas que marcaram uma fase que dá saudades. Só que fiquei frustrado porque nunca entrei de graça no Azteca, embora tenha ido lá incontáveis vezes.

Anônimo disse...

Afim de esclarecer lembro que o cinema que ficava em frente ao Madrid era o COMODORO e não o Bruni Tijuca que ficava na Praça Saens Pena ao lado do Metro Tijuca.
Luiz Paulo

Jonga Olivieri disse...

Obrigado Luiz Paulo. Às vezes a memória falha...