quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

O sotaque das mineiras

Alguem me encaminhou este texto pela internet. Eu o guardei porque sabia que algum dia seria útil. Como agora, claro!

“Felipe Peixoto Braga Netto (1973), afirma que não é jornalista, não é publicitário, nunca publicou crônicas ou contos, não é, enfim, literariamente falando, muita coisa, segundo suas próprias palavras.
Alagoano, mora em Belo Horizonte e ama Minas Gerais.
Ele diz que nunca publicou nada, mas a crônica abaixo foi extraída do livro dele, “As coisas simpáticas da vida”, publicada pela Landy Editora, São Paulo (SP) - 2005, pág. 82.

O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar...
Afinal, se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar, sensual e lindo das moças de Minas ficou de fora?
Porque, Deus, que sotaque!
Mineira devia nascer com tarja preta avisando: 'ouvi-la faz mal a saúde'.
Se uma mineira, falando mansinho,me pedir para assinar um contrato, doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: 'só isso?'.
Assino, achando que ela me faz um favor...

Eu sou suspeitíssimo.
Confesso: esse sotaque me desarma.
Certa vez quase propus casamento a uma menina que me ligou por engano, só pelo sotaque.

Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas.
Preferem, sabe-se lá por que, abandoná-las no meio do caminho.
Não dizem: pode parar, dizem: 'pó parar'
Não dizem: onde eu estou?, dizem: 'onde queu tô.'
Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem - linguisticamente falando - apenas de uais, trens e sôs.

Digo-lhes que não.
Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade.
Fala que ele é bom de serviço.
Pouco importa que seja um juiz, um jogador de futebol ou um ator de filme pornô.
Se der no couro - metaforicamente falando, claro - ele é bom de serviço.
Faz sentido...

Mineiras não usam o famosíssimo tudo bem.
Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: 'cê tá boa?'.
Para mim, isso é pleonasmo.
Perguntar para uma mineira se ela tá boa é desnecessário...

Há outras.
Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada.
Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer: - Mexe com isso não, sô (leia-se: sai dessa, é fria, etc).
O verbo 'mexer', para os mineiros, tem os mais amplos significados.
Quer dizer, por exemplo, trabalhar.
Se lhe perguntarem com o que você mexe, não fique ofendido.
Só querem saber o seu ofício.

Os mineiros também não gostam do verbo conseguir.
Aqui ninguém consegue nada.
Você não dá conta.
Sôcê (se você) acha que não vai chegar a tempo, você liga e diz: '- Aqui, não vou dar conta de chegar na hora, não, sô.'

Esse 'aqui' é outra delícia que só tem aqui.
É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase.
É mais usada, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção: é uma forma de dizer 'olá, me escutem, por favor'.
É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor.

Mineiras não dizem 'apaixonado por'.
Dizem, sabe-se lá por que, 'apaixonado com'.
Soa engraçado aos ouvidos forasteiros.
Ouve-se a toda hora: 'Ah, eu apaixonei com ele...'
Ou: 'sou doida com ele' (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro).

Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira.
Nada pessoal
Aqui certas regras não entram.
São barradas pelas montanhas.

Por exemplo: em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer: - 'Eu preciso de ir..'
Onde os mineiros arrumaram esse 'de', aí no meio, é uma boa pergunta...
Só não me perguntem!
Mas que ele existe, existe.
Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório.

No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um tanto de coisa...
O supermercado não estará lotado, ele terá um tanto de gente.
Se a fila do caixa não anda, é porque está agarrando lá na frente.
Entendeu? Agarrar é agarrar, ora!

Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena, suspirará: '- Ai, gente, que dó.'

É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras...
Não vem caçar confusão pro meu lado!
Porque, devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro 'caça confusão'.
Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele 'vive caçando confusão'.

Ah, e tem o 'Capaz...'
Se você propõe algo a uma mineira, ela diz: 'capaz' !!!
Vocês já ouviram esse 'capaz'?
É lindo. Quer dizer o quê?
Sei lá, quer dizer 'ce acha que eu faço isso'!? - com algumas toneladas de ironia...

Se você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá: 'ô dó dôcê'.
Entendeu? Não? Deixa para lá.

É parecido com o 'nem...' . Já ouviu o 'nem...'?
Completo ele fica: '- Ah, nem...'
O que significa?
Significa, amigo leitor, que a mineira que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum.
Mas de jeito nenhum mesmo.
Você diz: 'Meu amor, cê anima de comer um tropeiro no Mineirão?'.
Resposta: 'nem...'
Ainda não entendeu? Uai, nem é nem.
Leitor, você é meio burrinho ou é impressão?

Preciso confessar algo: minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras.
Aliás, deslizes nada.
Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão.

Se você, em conversa, falar: 'Ah, fui lá comprar umas coisas...'..
- Que's coisa? - ela retrucará.
O plural dá um pulo.
Sai das coisas e vai para o 'que'!

Ouvi de uma menina culta um 'pelas metade', no lugar de 'pela metade'.
E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa, confidenciará:
- Ele pôs a culpa 'ni mim'.

A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas...
Ontem, uma senhora docemente me consolou: 'preocupa não, bobo!'.
E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras nem se espantam.
Talvez se espantassem se ouvissem um: 'não se preocupe', ou algo assim.
Fórmula mineira é sintética e diz tudo.

Até o tchau, em Minas, é personalizado.
Ninguém diz tchau, pura e simplesmente.
Aqui se diz: 'tchau pro cê', 'tchau pro cês'.
É útil deixar claro o destinatário do tchau...”

12 comentários:

Simey Lopes disse...

muito bom, a linguistica defende isso rs.
é interessante como em cada região do Brasil existem diferentes formas de se falar, num mesmo pais.

Jonga Olivieri disse...

Mas como as mineiras não existem... Sei disso porque sou casado com uma, Simey. Há 38 anos...

Simey Lopes disse...

Felicidades ...rs

Jonga Olivieri disse...

E o melhor é que sou feliz...
Mas o sotaque de mineira não desaparece. Parece que gruda.
Primeiro o "s" quase em "z".
Depois certas expressões que fazem parte do jeito mineiro de ser.

Popeye disse...

Conheci algumas que têm essa característica de falar molinho e serem irresistíveis. Uai!

Jonga Olivieri disse...

Dimaiiisss!

Spanish disse...

Eu sou mineira e esse trem de cada região ter uma forma diferente de falar e normal uai, nordestino diz oxente, no sul e tchê e nós uai, temos nosso jeito. Além de que , eu também sou apaixonada com pão de queijo.

Jonga Olivieri disse...

Sueli, esta postagem não se propõe a ridicularizar o sotaque das mineiras.
Apesar do texto nem ser de minha autoria, o achei muito engraçado, até porque, sendo casado com uma mineira (há 38 anos) conheço bem o seu lado, por vezes curioso de falar.
Porque até por isto sou um pouco mineiro...

Spanish disse...

Jonga,
Nao me entenda mal, sou mineira e amei o texto, eu quis somente brincar com meu vocabulario e usei as nossas palavras comuns, foi mal, desculpe se passei uma ideia de diferente.

Jonga Olivieri disse...

Ô Sueli... Mexe c'oisso não sô! Gostei demais da conta do seu comentário e achei que ocê diveras deve de continuar comentando.

Unknown disse...

PODE ATÉ SER QUE O TEXTO NÃO QUEIRA NOS RIDICULARIZAR, MAIS EXISTE VARIAS PESSOAS QUE USAM NOSSO SOTAQUE PARA FAZER PIADAS, PARA USAR COMO SE FOSSEMOS PESSOAS DE OUTRO UNIVERSO, E AS COISAS NÃO SÃO BEM ASSIM. CADA LUGAR COM SUA CULTURA,NÃO SOMOS PALHAÇOS PRA NINGUÉM FICAR RINDO DA FORMA COMO CONVERSAMOS. ISSO AS VEZES ME DEIXA BASTANTE CHATEADA, ALÉM SO SOTAQUE SOU UMA CIDADÃ COMO TODOS MINEIROS OU NÃO.

Jonga Olivieri disse...

Crisitane. Pelo menos não foi a minha intenção ao publicar.
Que ridicularizem por aí... Mas no meu caso é curtição mesmo!