domingo, 4 de agosto de 2013

Pensatas de domingo. Ou como estragar uma campanha sem fazer força!

Um dos anúncios da campanha original (remontado de acordo com o que me lembro)

Corria o ano de 1969, quando criamos a primeira campanha para ”Adocyl”, na Nova Proudon Propaganda, no Rio de Janeiro.

Estávamos, na ocasião, acabando de presenciar uma polêmica que ficou registrada como “A Guerra do Ciclamato”. O ciclamato é um adoçante artificial, 30 a 50 vezes mais doce que o açúcar, a sua patente foi comprada pela DuPont e mais tarde revendida para os laboratórios Abbott.
Em 1958, foi aceito na categoria de "Usualmente Reconhecido como Seguro", mas em 1966 um estudo reportou que o ciclamato produzia ciclo-hexilamina, um composto, tóxico em animais. Em seguida, o estudo realizado em 1969 concluiu que o ciclamato aumentava a chance de câncer na bexiga – em cobaias animais. E um outro finalmente mostrou casos de atrofia testicular, tambem em ratos.
Isso originou um pânico generalizado, já que os adoçantes, muito em voga na época, por serem novidade (justo quando começou a onda do “para estar na moda é preciso emagrecer”),  continham grande quantidade de ciclamatos... Nesta ocasião, a Nova Proudon foi procurada(1) pelo fabricante de um adoçante  –Adocyl –, que, pasmem, gabava-se de não ter ciclamato em sua composição.
E obviamente  a campanha criada partiu deste mote... Não me recordo de todas as peças, mas tenho certeza que a primeira era: “Depois da tempestade veio Adocyl”. O leiaute era simples e direto, apresentando a cara do produto. Não assinava com a logomarca porque ela constava na foto do produto. E finalizava com a frase “Não contem ciclamatos”. Todo o conceito e posicionamento criativo da peça, lembravam fatos recente demais para que os leitores não o associassem aos acontecimentos.

Tentei juntar alguns neurônios que me restam e consegui remontar este anúncio – inédito(2) – o mais próximo possível do que ele foi (ver acima), sendo que apenas a embalagem era outra, criada por nós, mas nunca utilizada... E as excelentes ilustrações do leiaute tiveram o Nilton Ramalho, a dar um toque final.
O cliente aprovou entusiasmadíssimo.
No entanto,  após algumas semanas nos procurou, alegando que precisávamos de um aproach menos agressivo, e que não falássemos mais em ciclamatos – o que nos causou suspeitas –, pedindo que fossemos mais objetivos e diretos na comunicação...

Da esquerda para a direita, as três etapas do anúncio, cada vez pior
Criamos então um anúncio que dizia: “Entre o regime e o prazer, fique com os dois”, e assinava com a frase: “Adoce tudo com Adocyl (logomarca)”, e, em baixo, “Sacarina pura com doçura” e “Não contem calorias”. A ilustração sugerida era uma foto reunindo sucos, leite e cafezinho e reforçada por um clássico pudim de leite. Mais uma vez, o cliente amou a ideia; que, claro estava perfeitamente dentro do breafing passado por ele.


Mas, para alem disso, o cliente pediu que a produção providenciasse uma “chícara mais colorida” (sic), ao invés da branca que estava no leiaute. Resultado: “embarangou” o anúncio... Acima, podemos verificar a involução gradativa do anúncio, o que me faz lembrar o papo do grande diretor de arte Joaquim Pêcego, que vim conhecer alguns anos depois, mas que dizia com muita propriedade que a melhor fase de uma criação, era enquanto o cliente ainda não tinha visto. Porque depois...


1. Segundo o cliente, ele foi atraído pelo trabalho da agência para a Servenco(3), no Rio, e os Laticínios Itambé, atendido pela filial mineira da Nova Proudon, em Belo Horizonte. Tanto que o fabricante de Adocyl, sediado em São Paulo dispensou as agências paulistas.

2. Como inédita ficou toda a campanha. E como naqueles tempos não havia computadores, o tempo devorou todas as peças.

3. A Construtora Servenco, durante décadas foi uma das maiores do Rio de Janeiro, tendo sido depois, uma das principais contas da Propaganda Estrutural, de Rogério Steimberg. Eu mesmo, na Nova Proudon, fiz excelentes e premiadas campanhas para eles...


5 comentários:

Anônimo disse...

O mais curioso de tudo é um marxista como tu, ter sido um publicitário tão dedicado ao sistema... Rssss!

L.P.

Joelma disse...

Muito engraçado, mas o próprio cliente prejudicando a ele mesmo!
Por que não deixar cada "macaco em seu galho"?

Jonga Olivieri disse...

Até por ser um marxista, sei a diferença entre o que penso e o que tanho que fazer para sobreviver.
Amigo, sou um marxista e não um monje franciscano... Rsss!

Mário disse...

Defendendo o Jonga, ele é de fato um marxista. Todas as suas posições o definem assim!
Quanto a trabalhar em publicidade, o que que você faz, L.P.? Será que não tem nada a ver com o sistema? Você por acaso é um autista?
Todos estamos inseridos neste sistema. Conheço a história do Jonga e sei que foi trabalhar nessa área porque sempre foi um artista.
Jamais seria um burocrata enterrado num escritório cercado de papéis e carimbos por todos os lados!

Jonga Olivieri disse...

Merci, Mario... Merci!